Minas Gerais

Coluna

O adeus à D. Marisa, à mulher, à mãe, à militante

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Makota Célia: "Obrigada D. Marisa, por ter sido junto a Lula a timoneira de uma história de vitórias e conquistas"
Makota Célia: "Obrigada D. Marisa, por ter sido junto a Lula a timoneira de uma história de vitórias e conquistas" - Ricardo Stuckert
Receba D. Marisa nossos mais profundos agradecimentos, carinho e saudades

As mães são como o arco-íris, colorem nossas vidas enchendo-as de luz e cores, dando-nos a segurança da beleza e do poder divino após as tempestades. Assim foi D. Marisa para os que a cercavam, principalmente para seu companheiro Lula, seus filhos e todos nós militantes petistas e dos movimentos negro e sociais. Um ponto de luz a iluminar nossa caminhada, nossos sonhos de um país melhor. Presença constante ao lado do presidente Lula, D. Marisa, como carinhosamente a chamávamos, trouxe para todos nós a lição de como o silêncio é importante e é uma clara demonstração de sabedoria. Seu silêncio para os holofotes e a mídia escondia na verdade uma personalidade determinante e amiga, uma mulher cuja opinião tinha grande peso nas decisões de seu companheiro, o presidente Lula. Uma mulher sensível, gentil, sempre disposta a dar um sorriso, mas uma mulher de pulso firme.

De suas mãos gentis e carinhosas saiu a primeira bandeira do PT. Costurada à mão, essa bandeira com todo o seu simbolismo tomou as ruas do país, coloriu as manifestações, alçou esperanças de que, a partir dali, todas e todos nós podemos ser estrelas de luz próprias, assim como, hoje, D. Marisa se tornou. O tecido encontrado em seus achados, que deu formato à maior de todas as bandeiras políticas de nosso país, nas décadas seguintes, simboliza o quão importante foi seu papel, que nada teve de secundário na vida e na luta por mundo melhor. Quem pensa que D. Marisa foi mais uma figurante no cenário político do país não sabe o quanto o silêncio é importante para alimentar a observação, formar opinião e ser liberado e expressado na hora certa para a pessoa certa. Assim foi D. Marisa ao longo de todos esses anos, nunca fugiu à luta, sempre se manteve altiva e observadora.

D. Marisa teve sua vida achincalhada, sua intimidade devassada pela sana e ódio dos que não entendiam quão bem fez a administração do presidente Lula ao país. Mas nunca se teve notícias de que ela tenha fraquejado ou deixado de lançar esperanças na verdade que sempre vem à tona. Tal qual o arco-íris que sempre vem após a tempestade, D. Marisa esperou. Ela, que lutou contra uma ditadura, saiu às ruas pelas Diretas, disputou ao lado de Lula eleições, perdeu algumas e ganhou duas, tornou-se primeira dama, jamais iria fraquejar diante da inverdade, da falácia e da exposição criminosa de uma mídia também criminosa.

Para nós, da Coordenação Nacional das Entidades Negras, que viemos assistindo estarrecidos os últimos acontecimentos em nosso país, fica a certeza de que o ódio mata, mata nossa subjetividade, mata nossas expectativas, mas não mata nossas esperanças. D. Marisa foi fundamental para que nosso país lançasse sobre todos nós um olhar eivado de solidariedade e reconhecimento de nossa importância social, política e econômica. Sua altivez nos inspirou, sua gentileza despertou em todos nós a certeza de que a política também é feita com olhares compreensivos, com pulsos fortes de quem acredita nas revoluções sociais. Temos em D. Marisa um exemplo de mulher que viveu a vida em sua plenitude máxima, que exerceu com dignidade todos os papéis que a vida lhe ofereceu, foi a namorada, a esposa, a mãe e a avó zelosa, amorosa e muito cuidadosa com sua família e que ainda conseguiu adotar as/os brasileiras/os a quem dedicou longos anos de sua vida, lutando para que pudéssemos ter assegurados nossos direitos básicos à dignidade e cidadania.

Sua escola não foram os bancos das academias, mas as ruas de nosso país. Seus diplomas, o sorriso nos rostos da/os brasileiras/os, que a partir da gestão de seu marido puderam ter comida em suas mesas, trabalho, moradia e o direito a uma existência mais digna e plena. Não desfilou arrogância, ao contrário, seu sorriso sempre foi franco e sincero. Não recepcionou a elite que não a entendia em sua simplicidade, mas recepcionou os movimentos dos trabalhadores e sociais e a esses dedicou seu tempo, sua solidariedade e sabedoria de que só as mulheres do povo sabem ter e dividir.

Compreendemos, no entanto, que chegou sua hora, a hora de retornar para os braços daquele que nos deu a oportunidade e a benção de a ter conosco. Por isso, ainda que em meio à dor da perda, só podemos agradecer e louvar a Deus pela oportunidade de termos tido você como nossa grande comandante, nossa timoneira, que nos momentos incertos nos deu o rumo certo, que viveu com grande capacidade nossas dores, alegrias e compartilhou, como ninguém, nossos sonhos.

Quantas vezes vimos seus olhos vibrarem conosco nossas alegrias, reivindicações, nossas tristezas e nossas vitórias nos espaços políticos. Você foi para nós muito mais do que se possa imaginar. E, junto com Lula, plantou tão bem a semente do seu amor a nosso país, a nossa gente, cuja raiz jamais nos abandonará.

Por isso, nos esforçaremos para transformar sua morte em apenas um até logo, onde só caberá a saudade, o carinho e o afeto destes que lhe serão eternamente gratos pela sua vida. Sabemos que agora você se torna uma estrela, tal qual aquela que um dia costurou na bandeira vermelha, depositária de tantos sonhos e esperanças, e se somará a outros revolucionários para nos proteger e velar por cada um de nós. Receba, D. Marisa, nossos mais profundos agradecimentos, carinho e saudades. Sabemos que o Brasil perdeu uma grande e gentil dama e está mais pobre, que sua presença nos fará falta, mas também sabemos que essa ausência nos alimentará em nossos mais profundos desejos de continuar a lutar.

Somaremos a outros milhões de brasileiros/as na saudade que nos impulsionará a continuar a sua luta. Sabemos que as mães, as pessoas boas, justas e gentis às vezes fazem isso conosco, viajam sem deixar aviso prévio para o indelével mundo da saudade. E que a nós só resta o aprendizado de conviver com esta saudade, que acaba sendo muito boa, pois só a sentimos do que aprendemos a amar na vida. Obrigada, D. Marisa, por ter sido junto a Lula a timoneira de uma história de vitórias e conquistas. Saiba que aqui permanecem as lições apreendidas de uma grande e sábia mulher.

*Célia Gonçalves Souza é jornalista, empreendedora social da Rede Ashoka e coordenadora nacional do CENARAB.

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