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Farinha pouca, vamos dividir o pirão

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Escritor Mouzar Benedito fala sobre os ditados populares que incentivam valores desumanos
Escritor Mouzar Benedito fala sobre os ditados populares que incentivam valores desumanos - Agência Brasil
Gosto de ditados que mostram a “sabedoria popular”, e que não sejam desumanos

“Farinha pouca, meu pirão primeiro”.

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Conheço esse ditado há um tempão, e nunca gostei dele. Mas recentemente ele tem se tornado cada vez mais usado. 

É coisa de individualista, de quem gosta de levar vantagem em cima dos outros, de pegar o que puder e deixar que os outros se ferrem. 
Estranho é que nesta época em que se critica tanto tudo o que é “politicamente incorreto” não ouço críticas a ele. Ao contrário, falam isso achando que estão mostrando sabedoria.

Um outro ditado recomenda que devemos abocanhar o que pudermos, tirando dos outros: embora quase todo mundo faça pose de bom e justo, na hora agá a coisa muda. Para justificar isso, dizem que “quem parte e reparte e não fica com a melhor parte, ou é tolo ou não tem arte”. 

Já vi até briga de irmãos por causa de herança em que um engana o outro, fica com a tal melhor parte, e se julga esperto por isso.

Gosto de ditados que mostram a “sabedoria popular”, mas não gosto de alguns que podemos achar desumanos, cruéis, aproveitadores e outras coisas que se pode chamar de “ruins”, como esses que citei.

E eles são muitos.

Por exemplo: bater em filhos. Isso é normal? Antigamente era “comum”, e hoje em dia há quem tenha saudade disso. Só que até a lei considera isso inaceitável. Mas vejam esse ditado: “Quem não faz filho chorar, chora por eles”. 

Tem um que aconselha que sejamos maus quando derrotamos alguém. Nada de ser respeitoso com os inimigos, não impor a eles coisas desonrosas, nem exigir demais deles, não castigar com crueldade. Segundo um ditado, “quem seu inimigo poupa, fica sem roupa”.

Tem um que deve ser usado por muita gente que quer o sucesso a qualquer custo. A receita para ser “vencedor” é não ter vergonha na cara, segundo o ditado “quem não tem vergonha, todo o mundo é seu”. 

Um ditado que acho horroroso, mas que algumas pessoas falam com a boca cheia é “manda quem pode, obedece quem tem juízo”. Quer dizer que temos que ser obedientes aos poderosos? Não dá. 

Quando alguém me fala esse ditado, eu respondo: não tenho poder nenhum, mas também não obedeço quem tem. Não tenho juízo e gosto de não ter.

Paro por aqui, mas um dia ainda volto ao assunto.
 

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