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Carta de um namorado apaixonado

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Escritor Mouzar Benedito conta "causos" sobre o Dia dos Namorados
Escritor Mouzar Benedito conta "causos" sobre o Dia dos Namorados - Arquivo/EBC
Eu via o Napoleão lendo e escrevendo cartas praticamente todos os dias

Pensando no Dia dos Namorados, eu me lembrei de um amigo, o Napoleão, que aos quarenta anos, solteirão, fez uma viagem pelo interior de Goiás e arrumou uma namorada linda, a Elvira, que tinha a metade da idade dele. 

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Ficou apaixonado.

Mas não tinha dinheiro nem tempo para viajar para Goiás com a frequência que gostaria.

E era uma época em que a gente nem sonhava que um dia haveria a internet e seria possível conversar diariamente com a amada distante, vendo a imagem dela na tela do computador ou do telefone celular.

Aliás, celular era outra coisa que não existia. Mesmo telefone comum, fixo, não era pra qualquer um, pouca gente tinha.

Além disso, telefonema interurbano custava caro.

Por isso, o Napoleão recorria às cartas, como faziam os namorados de antigamente. Escrevia quase diariamente para a Elvira, e ela respondia.

Eu morava numa república, em São Paulo, e meus colegas de moradia eram seis operários, um bancário e o Napoleão, que era alfaiate.

Eu via o Napoleão lendo e escrevendo cartas praticamente todos os dias e tinha uma certa curiosidade sobre tanta troca de correspondência. Haja assunto!

Um dia, às vésperas do dia dos namorados, ele escreveu uma carta especial para a Elvira e me mostrou para colocar no correio em seguida.

A carta dizia o seguinte:

Querida Elvira,

Hoje eu me levantei às seis e meia da manhã. Fiz a barba, tomei banho, vesti a roupa e decidi que não iria trabalhar.

Desci até o bar ao lado do prédio, tomei um café, saí pela rua Francisca Miquelina, peguei a Maria Paula e fui até a esquina da Consolação. Vacilei um pouco e peguei a Consolação em direção ao centro.

Passei em frente à Biblioteca Municipal, continuei pela Xavier de Toledo, parei uns quinze minutos olhando as vitrinas do Mappin, fui até a praça Ramos de Azevedo e parei um pouco na escadaria do Teatro Municipal.

Segui pela Conselheiro Crispiniano até o largo Paissandu, subi a São João e entrei na Ipiranga.

Parei na praça da República e fiquei um tempão sentado num banco... 

Tudo isso pensando em você.

Beijos,

Napoleão

Achei a carta divertida. E parece que a Elvira gostava do estilo do Napoleão, porque dali poucos meses eles se casaram. E consta que foram felizes. 
 

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