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Conhecida no Brasil e fora, produtora Filmes de Plástico completa 10 anos

A renomada equipe de Contagem (MG) será a grande homenageada da 13° Mostra Cine BH

Brasil de Fato | Belo Horizonte (MG) |
“Nós somos frutos direto da possibilidade de melhores investimentos em políticas públicas”, diz produtor
“Nós somos frutos direto da possibilidade de melhores investimentos em políticas públicas”, diz produtor - Foto: Divulgação

De Contagem e Teófilo Otoni para o mundo! Neste ano, a renomada produtora mineira Filmes de Plástico comemora uma década de existência. Na bagagem, dezenas de longas e curtas, além do passaporte carimbado pelos festivais de Cannes, Locarno e Rotterdã, entre outras grandes praças do cinema mundial. Neste ano a produtora será a grande homenageada da 13° Mostra Cine BH. Pra contar um pouco da trajetória dos artistas e dos desafios diante do cenário de censura e cortes no setor, nós conversamos com Thiago Macêdo Correia, produtor de cinema e um dos fundadores da Filmes de Plástico.

Brasil de Fato - Em 2019 a Filmes de Plástico completa dez anos de trajetória no cinema brasileiro. Na bagagem, dezenas de produções e diversos prêmios nacionais e internacionais. Como surgiu a produtora?

Thiago Macêdo Correia - A produtora é formada por três diretores: André Novais Oliveira, Gabriel Martins, Maurílio Martins e eu, que sou produtor. Os três são naturais de Contagem, dos bairros Amazonas, Milanez e Jardim Laguna e eu sou de Teófilo Otoni. Nós nos conhecemos entre 2005 e 2006. Apesar de serem vizinhos o André, Gabriel e Maurílio não tinham se conhecido ainda. Eles se encontraram no curso de graduação em cinema e em paralelo eu, o André e o Gabriel fazíamos um curso técnico na Escola Livre de Cinema. Então, naturalmente a produtora foi se conformando em torno daquele grupo de amigos cinéfilos, que tinham uma paixão e uma vontade grande de produzir cinema. Mas na época isso era mais um sonho do que uma possibilidade mais concreta. Logo em seguida, em 2009, o Gabriel pensou um roteiro de um filme pra ser produzido no quintal da casa dos pais dele e foi aí que nós fizemos o “Filme de Sábado”, que marcou o início simbólico da produtora. Daí pra frente sentimos a necessidade de criar uma identidade que caracterizasse as produções futuras desse grupo e aí surgiu definitivamente a Filmes de Plástico.

Ao longo desses dez anos, as narrativas abordadas nas produções da Filmes de Plástico sempre trazem à luz aqueles que geralmente são apagados da história do cinema, pessoas que estão à margem da sociedade. Isso foi uma opção desde sempre?

Toda vez que perguntam pra gente porque nós achamos que os filmes dão certo, eu sempre falo que o primeiro passo pra isso funcionar é porque nós somos muito sinceros com o que produzimos. Nós não fazemos nada porque o assunto está em voga, porque quer chegar em determinado mercado. Os nossos projetos nascem de um lugar altamente legítimo, do nosso interesse comum, que apontam para lugares que representam nossa postura enquanto cidadãos, brasileiros, artistas e trabalhadores. Então, os filmes que fazemos são representações legítimas das coisas nas quais acreditamos. E antes de tudo, nós acreditamos naquilo que produzimos. Eu acho que essa sinceridade é muito importante para que essas obras possam reverberar. E como elas não partem desse lugar calculado, nós estamos falando de vida, de seres humanos, de dramas que estamos vivendo. Então acho que funciona porque é verdade. E eu me sinto orgulhoso de saber que a Filme de Plástico usa a arte e o cinema a favor da expressão do nosso ponto de vista do mundo. E as pessoas se identificam com essa realidade, com essa verdade, mesmo você falando de algo íntimo ou particular ele se torna algo universal.

Porque é importante ter uma produtora que disputa a narrativa e tenta construir uma outra forma de conceber a sociedade?

Quando começamos a produzir filmes, era uma época de muito fomento do setor, diversos editais de incentivo, casado com isso, uma maior democratização tecnológica. Então nesse momento, diversos outros grupos também estavam neste caminho pelo Brasil. Eu acho que a repercussão que nós tivemos nacional e internacionalmente com a Filmes de Plástico - e também a trajetória de diversas outras produtoras desse mesmo caminho - ajudaram as pessoas a acreditarem que é de fato possível fazer cinema no Brasil. Porque isso hoje é possível. Eu acho que as pessoas olham para a produtora e veem algo que é de fato alcançável. Uma pessoa do interior, da periferia se identifica vendo outros, que vieram desse mesmo lugar, em uma posição de destaque e reconhecimento. Eu acho que isso faz com que essas pessoas também tenham o desejo de produzir, de ocupar esse espaço, o que em outras épocas era mais difícil de alcançar e imaginar. A influência da Filmes de Plástico passa por aí, de simbolizar algo possível. É esse o retorno que nós temos de outros artistas, de que a produtora conseguiu ocupar um lugar que tradicionalmente não era ocupado por essa parcela da sociedade.

Qual a resposta da população de Contagem e de outras regiões periféricas sobre as produções da Filmes de Plástico?

É um retorno muito bonito porque é um processo de resgate e reconhecimento de uma população. Tanto nas estreias que fazemos nos bairros onde gravamos os filmes, quanto nas redes sociais após a inserção de Temporada na Netflix - que conseguiu atingir um público ainda mais plural e diverso - mostra o quanto essa população se sente parte dessa produção, de se pertencer, de achar que de fato estão sendo representados de modo legítimo. Esses retornos que temos, principalmente dos bairros onde filmamos - Amazonas, Milanez e Jardim Laguna em Contagem - mostram o quanto as pessoas abraçam a produção, assumem os filmes como delas. É algo muito bonito, que acima de qualquer coisa demonstra como essas populações - que são vistas de forma marginalizada - se sentem orgulhosas da representação da vida delas, não de estereótipos, mas da vida delas como de fato é.

Qual opinião de vocês sobre o atual cenário brasileiro, de censura, cortes de investimento em cultura e ataque ao setor?

É um cenário que nos deixa bastante preocupados porque nós somos fruto direto da possibilidade de melhores investimentos em políticas públicas. A Filmes de Plástico surgiu e se fortaleceu a partir de editais públicos e graças a isso geramos emprego, projetamos carreiras. Existe uma parcela muito grande da população que depende do audiovisual e da arte para sobreviver. Me preocupa nós estarmos vivendo isso, uma vez que é um paradoxo estarmos em uma das maiores crises para o cinema nacional justamente no ano de maior repercussão artística, talvez o maior da história para a produção nacional.            É assustador pensar que por interesses políticos um meio possa viver uma crise tão drástica.

O meu recado para as pessoas da área, principalmente para as que estão começando, é que elas se unam para lutarmos pela manutenção do nosso modo de vida, do nosso modo de fazer arte. Porque, por mais assustador que seja, a gente precisa se fortalecer, a gente precisa estar junto. E o meu recado para as pessoas que não são da área é para que elas se informem. Que elas saibam que existem várias notícias que não são verdadeiras sobre a produção cultural. Eu gostaria de sugerir que elas se informassem sobre o modo como os filmes são feitos, como funcionam as captações e que se atentem para esta visão equivocada de que os artistas sugam dinheiro público. Porque a partir disso elas vão conseguir entender o quão essencial é que a arte, o audiovisual, continuem sendo incentivados pelo poder público.

13° Mostra CineBH

Entre os dias 17 e 22 de setembro, Belo Horizonte recebe mais uma edição da Mostra CineBH. Na programação curtas, longas e diversas atrações. Cinco espaços culturais da capital vão ser tomados pelo evento; Fundação Clóvis Salgado (Palácio das Artes), Sesc Palladium, Cine Theatro Brasil Vallourec, Teatro Sesiminas e MIS Cine Santa Tereza. Durante os seis dias de programação gratuita, a mostra exibe 85 filmes de 11 estados brasileiros e o Distrito Federal além de produções da Argentina, Colômbia, EUA, França e Portugal.

Neste ano temática central da Mostra é “A internacionalização do cinema brasileiro e os desafios para o futuro”. Desde 2015, somam-se 166 títulos brasileiros selecionados em mostras competitivas, paralelas ou sessões especiais de Cannes, Berlim, Locarno, Roterdã e Veneza – considerados os eventos mais importantes para exibição no mundo. A programação completa do festival pode ser acessada aqui.

Filmografia Filmes de Plástico

Curtas:

» Filme de sábado (2009). Direção de Gabriel Martins

» No final do mundo (2009). Direção de Gabriel Martins

» Gabriel Shaolin Mordock (2009). Direção de Gabriel Martins

» Pelos de Cachorro (2009). Direção de Gabriel Martins e Maurilio Martins

» Fantasmas (2010). Direção de André Novais Oliveira

» Contagem (2010). Direção de Gabriel Martins e Maurilio Martins

» Dona Sônia pediu uma arma para seu vizinho Alcides (2011). Direção de Gabriel Martins

» Domingo (2011). Direção de André Novais Oliveira

» Pouco mais de um mês (2013). Direção de André Novais Oliveira

» Quinze (2014). Direção de Maurilio Martins

» Mundo Incrível REMIX (2014). Direção de Gabriel Martins

» Quintal (2015). Direção de André Novais Oliveira

» Rapsódia para o homem negro (2015). Direção de Gabriel Martins

» Constelações (2016). Direção de Maurilio Martins

» Nada (2017). Direção de Gabriel Martins

Longas:

» Ela volta na quinta (2014). Direção de André Novais Oliveira

» No coração do mundo (2019). Direção de Gabriel Martins e Maurilio Martins

Longas em processo de finalização:

» Marte Um (2020). Direção de Gabriel Martins

Co-produção de longa:

» Baronesa (2017). Direção de Juliana Antunes

Edição: Elis Almeida