Minas Gerais

ARTIGO

Nos 110 anos da Academia Mineira de Letras

As boas tradições devem ser preservadas, sem dúvida, mas isso não impede o diálogo com o contemporâneo

Belo Horizonte |
Detentora de acervo de 35 mil livros, cartas, manuscritos e obras raras, a academia planeja expor as suas coleções ao público
Detentora de acervo de 35 mil livros, cartas, manuscritos e obras raras, a academia planeja expor as suas coleções ao público - AML

Fundada há cento e dez anos, em dezembro de 1909, em Juiz de Fora, por um grupo de pessoas entusiasmadas pela cultura, a Academia Mineira de Letras (AML) transferiu-se para Belo Horizonte em 1915. Foi somente em 1943, no entanto, que adquiriu sua primeira sede própria, no centro da cidade. No final dos anos 1980, ela se instalou na rua da Bahia, onde está até hoje. Ao lado de sua sede, a instituição conseguiu construir um auditório com capacidade para 90 lugares, onde conduz a sua intensa programação, gratuita e aberta ao público.

A missão da Academia é promover a língua portuguesa e a literatura. Não é à toa que, ao longo das 11 décadas de sua existência, a esmagadora maioria de seus integrantes tenha sido formada por prosadores, poetas e professores. Os três últimos membros eleitos pela Casa vieram da UFMG: Caio Boschi, Jacyntho Lins Brandão e Wander Melo Miranda. A partir dos nomes que passaram por suas cadeiras, é possível contar um pouco da história literária de Minas. Cito apenas alguns: Alphonsus de Guimaraens, Abgar Renault, Afonso Arinos de Melo Franco, Alaíde Lisboa, Bartolomeu Campos de Queiroz, Cyro dos Anjos e Henriqueta Lisboa. Hoje, fazem parte de sua composição escritores como Benito Barreto, Fábio Lucas, Luís Giffoni, Márcio Sampaio, Maria José de Queiroz, Olavo Romano, Rui Mourão e Yeda Prates Bernis.

Fiel ao que motivou a sua criação, a Academia Mineira de Letras faz um convite permanente ao público: para que frequente o seu espaço e acompanhe as suas atividades. Presente na internet e nas redes sociais (está no instagram, no facebook e no youtube), a AML se preocupa, cada vez mais, em dar visibilidade a todas as expressões do campo literário, sem preconceito ou discriminação de qualquer natureza.

As boas tradições devem ser preservadas, sem dúvida, mas isso não impede o diálogo com o contemporâneo, em toda a sua complexidade. Não há nada mais importante que desenvolver um olhar atento e sensível às novidades, e uma escuta fina e delicada do que elas representam. É preciso, ainda, ampliar a voz daqueles que não desfrutam de muitos meios para se fazerem ouvir.

Inspirada por essas crenças, a entidade organizou sessões especiais para tratar de obras e autores esquecidos ou marginalizados. Entre as palestras já realizadas, destaco as de Constância Lima Duarte sobre Nísia Floresta; a de Eduardo de Assis Duarte sobre Maria Firmina dos Reis, e a de Ivete Walty sobre Carolina Maria de Jesus. Para 2020, já estão previstas conferências sobre literatura indígena, literatura queer e literatura erótica. A diversidade é valor e princípio. É o que torna a convivência humana mais agradável,  interessante, sofisticada e rica.

Detentora de acervo composto por mais de 35 mil itens, entre livros, cartas, manuscritos e obras raras, a Academia Mineira de Letras planeja, para breve, expor integralmente as suas coleções à consulta geral, cumprindo, também nessa frente, o seu papel social. O mesmo se passará com o Palacete Borges da Costa, onde a Academia funciona. Em processo de musealização, espera-se que, até o começo de 2021, seja possível abri-lo para visitas guiadas por monitores especializados.

Tais ações são fruto do apreço que a entidade tem pela Cultura e da firme convicção de que ela é direito de todos, assegurado pela Constituição Federal. Não há país desenvolvido e forte sem o investimento de toda a sociedade e do Estado na área cultural. Afinal, a Cultura é o solo a partir do qual o povo ergue as suas identidades, se movimenta pelo tempo presente e sonha o futuro.

*Rogério Faria Tavares é jornalista e presidente da Academia Mineira de Letras

Edição: Elis Almeida