CIÊNCIAS

Criança suja é mais saudável?

Entenda a chamada Hipótese Higiênica, proposta por David Strachan em 1989

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"Se na infância temos contato com uma diversidade de microrganismos maior, nosso sistema imunológico desenvolverá mais mecanismos de memória para nos defender no futuro contra possíveis infecções" - Créditos: MST/Divulgação
Contato com microrganismos ajudam sistema imunológico

Como já foi dito aqui em outras oportunidades, uma grande contribuição da ciência foi entender a relação entre certas doenças e o nosso contato com microrganismos. Desde que percebemos isso, a expectativa de vida humana aumentou bastante, pois pudemos evitar e combater corretamente diversas enfermidades.

Porém, após décadas de combate aos microrganismos, alguns pesquisadores começaram a se perguntar se o excesso de limpeza não seria também, de certa forma, prejudicial.

Em 1989, David Strachan publicou um artigo que deu início à chamada Hipótese Higiênica. Ele sustentou que o contato com microrganismos diversos presentes no ambiente, durante o início da vida de uma pessoa, pode evitar com que, no futuro, ela desenvolva doenças alérgicas como asma e eczemas de pele.

De lá pra cá, diversos estudos foram realizados para testar a ideia levantada por David. De maneira geral, podemos dizer que após 30 anos a hipótese se mostra bastante plausível.

Se na infância temos contato com uma diversidade de microrganismos maior, nosso sistema imunológico desenvolverá mais mecanismos de memória para nos defender no futuro contra possíveis infecções

Eis alguns exemplos. Em trabalho de 2002, pesquisadores do Reino Unido acompanharam milhares de crianças. Observaram os níveis de higiene da família nos primeiros 15 meses de vida. Depois compararam isso com o aparecimento de alergias nos 27 meses seguintes. Constatou-se uma relação positiva entre maiores níveis de higiene e o aparecimento das alergias.

Em outro trabalho, de 2010, o pesquisador estadunidense Gary Huffnagle inoculou microrganismos e antibióticos em camundongos e analisou a relação disso com o aparecimento de alergias nos animais. Mais uma vez os resultados foram semelhantes.

A lógica é a seguinte. Se na infância temos contato com uma diversidade de microrganismos maior, nosso sistema imunológico desenvolverá mais mecanismos de memória para nos defender no futuro contra possíveis infecções. Além disso, a presença de uma microbiota (o conjunto de microrganismos que vivem em nosso organismo) rica é importante para evitar a instalação de invasores que causam problemas.

Assim, vê-se que, além do excesso de cuidados com as crianças para que não se sujem, outros fatores reforçam a hipótese. O tamanho das famílias, o contato com animais domésticos, o uso excessivo de antibióticos e desinfetantes, e até o tipo de parto parecem sim ter relação com o desenvolvimento de certas doenças.

Via de regra, famílias com mais filhos, com animais domésticos, em que as crianças nascem de parto normal e com menor rigor na higiene apresentam menores chances para o desenvolvimento das doenças alérgicas na vida adulta.

Um abraço e até a próxima!

Renan Santos é professor de biologia da rede estadual de Minas Gerais.

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Edição: Elis Almeida