Rio Grande do Sul

PANDEMIA

Prefeitos podem ser responsabilizados por “tratamento precoce” da covid-19

O Tribunal de Contas do Estado está realizando uma auditoria em 27 prefeituras que utilizam o “tratamento precoce”

Brasil de Fato | Porto Alegre |
A cloroquina é uma medicação usada há 70 anos no Brasil principalmente como forma de combater a malária e o lúpus. - Foto: Governo do Pará

O Tribunal de Contas do Estado está realizando uma auditoria em 27 prefeituras que utilizam o “tratamento precoce” da covid-19, incluindo a da Capital. Paralelamente, corre na 10ª Vara Cível de Porto Alegre uma ação civil pública contra o pedido feito pelo prefeito Sebastião Melo ao Ministério da Saúde  de 25 mil cartelas de cloroquina para serem distribuídas na rede pública, ajuizada pela bancada de vereadores do PSOL e pela deputada federal Fernanda Melchionna.

O TCE foi acionado pelo procurador de contas Geraldo da Camino e o pedido foi acolhido pelo presidente daquela corte, José Estilac Xavier. Da Camino explicou ao Brasil de Fato que domingo, após ouvir as declarações dos diretores e técnicos da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) de que não existia tratamento para a covid-19 reconhecido cientificamente, passou o resto da noite redigindo o pedido para a ação do TCE antes de entrar em licença, o que ocorreu na terça-feira.

Da Camino recomenda que a auditoria leve em conta três pontos: respaldo técnico, regularidade dos procedimentos licitatórios, com ênfase na adequação aos preços de mercado, e eventual responsabilidade do erário por danos resultantes da adoção de tratamentos cuja eficácia não tenha sido demonstrada. “No levantamento efetuado, não foi possível identificar estudos que comprovassem a redução da mortalidade ou hospitalização em pacientes por covid-19 com a utilização dos fármacos.” As prefeituras são da região de Bento Gonçalves além da capital do estado. Ele sugere “medida cautelar com as pertinentes determinações aos gestores dos Executivos Municipais” em caso de comprovação de eventual dano à saúde da população com a aquisição destes medicamentos.

Oposição entra na Justiça

Já o líder da bancada de oposição na Câmara de Vereadores, Pedro Ruas (PSOL), afirmou que “as conclusões da Anvisa, da ineficácia desse kit recomendado pelo governo Bolsonaro e seu ministro General, nós já sabíamos. Apenas veio corroborar com os argumentos da nossa ação”. Conforme Ruas, tanto a manifestação da Faculdade de Medicina de Porto Alegre, que na sexta-feira (8) distribuiu um documento contrário ao uso desse kit, quanto a fala da Anvisa, no domingo, serão aditados ao processo do PSOL.

Na avaliação de Ruas, o prefeito de Porto Alegre está cumprindo o que se mostrou na campanha, sempre alinhado com Bolsonaro. “E agora, com dinheiro público, ele joga com a saúde da população, ajudando a gastar o estoque de cloroquina e outros medicamentos inadequados ao tratamento da covid, comprados pelo negacionista Bolsonaro.” Ruas acrescentou que os dois documentos foram anexados à ação civil publica que está correndo na Justiça.   

Melo confessa o uso, mas nega a compra

Na quarta-feira (20), em entrevista à rádio Gaúcha, o prefeito Sebastião Melo (MDB) declarou que fez o pedido, mas não se trata de uma compra. Ele justificou que conhecidos seus da classe média alta estão fazendo o tratamento precoce e, por isso quis disponibilizar a terapia aos pacientes do SUS. Mas explicou que se o Ministério da Saúde não enviar gratuitamente os comprimidos de cloroquina pedidos ele não os comprará. Já os outros medicamentos como o vermífugo e os antibióticos que fazem parte do Kit Covid receitado e distribuído por diversas prefeituras já fazem parte dos distribuídos pelo SUS, embora para tratar outras doenças.

Apesar de ter sido atestado pelas autoridades científicas da Organização Mundial da Saúde (OMS) que não havia tratamento para a covid-19, o governo federal insistia até a semana passada no chamado “tratamento precoce”, inclusive tinha um aplicativo “Tratecov” que induzia os médicos e outros usuários a utilização de medicamentos como cloroquina, hidroxicloroquina, ivermectina, amoxicilina e outros antibióticos. Na quarta-feira o aplicativo foi retirado do ar e, segundo a Rede Globo, o governo alegou problemas técnicos do aplicativo.

Já na sexta-feira (15), o Conselho da Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Rio Grande do Sul divulgou uma nota demonstrando “grande preocupação” e que coloca em dúvida as medidas de combate à pandemia da covid-19 adotadas em Porto Alegre, na gestão do prefeito Sebastião Melo.

Diz a nota, que "o relaxamento de medidas protetivas de distanciamento e proteção pessoal, as quais possuem evidências significativas de efetividade, assim como o fornecimento de medicamentos sem comprovação científica para a profilaxia dessa infecção - o chamado “tratamento precoce” - incorrem em um equívoco na condução das políticas de saúde pública, as quais devem estar voltadas à redução de casos infectados e de óbitos causados por essa doença".

O Brasil de Fato pediu a posição do Conselho Regional de Medicina (Cremers) sobre o fato ainda na segunda-feira e até a quarta-feira a assessoria de comunicação do Cremers não tinha resposta da direção.


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Edição: Katia Marko