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Vila Torres e a covid-19

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Vila das Torres em 1950 e em 2020. Fonte: IPPUC e Google (2020) - Reprodução
Até o momento, a Vila das Torres combate o coronavírus e as políticas genocidas bravamente

A “Favela do Capanema”, região central em Curitiba, localizada no Prado Velho e cercada pelo corredor “rodoviária-aeroporto”, universidade e colégios particulares, e bairros de classe média alta tem sua história iniciada nos anos de 1950 com uma ocupação nas terras do Barão do Capanema, vizinha ao antigo Jockey Club da cidade.

A maior parte das famílias que ali se fixaram, oriundas do norte do estado, vítimas do êxodo rural (causada pela forte industrialização dos grandes centros urbanos e/ou pela geada negra de 1975), chegaram entre a década de 1960 e 1970, inclusive a de sobrenome “pinto” que deu origem ao antigo nome da região de “Vila Pinto”.

Em 1970 foi iniciado o processo de revitalização da região por parte da Cohab, e somente em 1990 ocorreu o loteamento e regularização da região, que passou a se chamar “Vila das Torres” por conta das enormes torres que ficavam no canteiro central da Avenida Comendador Franco. A região hoje conta com aproximadamente 5 mil pessoas, e a maioria sobrevive pela coleta e separação de materiais recicláveis, muitos carrinheiros e depósitos de reciclagem, e cooperativas que possuem acordo com a Prefeitura

Com a implosão da pandemia de Covid-19 e a paralisação de algumas atividades, a vulnerabilidade socioeconômica (e consequentemente sanitária) se intensificou na região. Com este cenário, surgiu a necessidade da união da população. Por meio da Associação de Moradores e pela igreja católica, representada pelo Padre Parron e a Irmã Claudia, com o apoio da Únidade Básica de Saúde (UBS Capanema), foram realizadas diversas tarefas de conscientização e de doação de máscaras e álcool para a população.

Pelo Comitê Sanitário de Defesa Popular da Vila das Torres também foram doados máscaras, sabão e desinfetantes. Foi criado o projeto “SOS Vila Torres” que reúne empresas do ramo educacional (como os Jesuítas, Maristas, e Bom jesus, dentre outras). Por esse movimento, há um ano, todos os meses, a população da região recebe doação de cestas básicas para suprir a ausência de políticas públicas voltadas a essa população (um auxílio emergencial digno).

Como combate contra a pandemia, a medicina preventiva, da família e comunidade são ainda mais essenciais neste momento. Um dos sujeitos que mais protagonizam esse tipo se saúde são os Agentes Comunitários de Saúde, classe que sofre com o sucateamento promovido no SUS.

Em Curitiba, o número de agentes contratados é suficiente apenas para atender apenas 15,44% da população de acordo com o Ministério da Saúde. Com essa defasagem, e com a experiência da campanha Periferia Viva em Recife, foi decidido construir uma capacitação de Agentes Populares de Saúde na vila, ministrado por integrantes de movimentos populares, em parceria com a rede de médicos populares e a UBS do bairro. Esses agentes não substituem os comunitários, mas dão um suporte a eles, já que seu objetivo é levar informações e conhecimento sobre o Covid-19 para as pessoas de seu entorno, fazendo o papel de um agente social ativo.

Suas funções variam desde a identificação de doenças que afetam a população de sua rua ou quadra, até o repasse dessas informações a UBS para que tome providência. Nesse momento de pandemia e de desinformação, esse agente surge como um dos protagonistas do combate a essas duas situações já que de maneira resumida, possui a função de orientar, prevenir, e orientar quando as situações do coronavírus e do dia a dia. Na Vila das Torres, estas capacitações começaram durante o ano passado, sendo realizado um encontro por semana, com no máximo 15 pessoas pra evitar aglomeração e respeitar as medidas sanitárias de combate.

O primeiro módulo consistiu no resgate histórico da vila, e o resgate identitário de reconhecimento como sujeito morador da vila das torres, com o objetivo de lutar pelos seus iguais. Somado a isso foram feitos vários encontros com o objetivo de ensinar as medidas de combate ao vírus, e as orientações caso apresentasse os sintomas. Também houve dias que foi falado sobre a importância do combate a “fake news” e a importância da vacinação, deixando de lado todo o teor negacionista da pandemia.

Com a ajuda do programa de extensão em saúde do curso de enfermagem da UFPR (PET – Saúde), alguns vídeos foram criados e disseminados pelos grupos de Whatsapp e páginas de Facebook da comunidade. O grupo, denominado “Coordenação política pedagógica de Agentes de Saúde Curitiba”, responsável por essa capacitação tem por objetivo (após a diminuição dessa curva acentuada de casos de covid) a implementação do módulo 2 (mais prático) na comunidade, e a expansão da mesma capacitação para outras áreas vulneráveis de Curitiba, principalmente as novas ocupações que surgiram com a pandemia.

Até o momento, a Vila das Torres combate o coronavírus e as políticas genocidas bravamente. Uma coisa não se pode negar, a população dessa região ganhou uma coisa muito boa com essa pandemia, a sua consciência de classe. Muitos hoje percebem como eram explorados, alguns ainda são, e como o Estado poderia, ativamente, contornar essas situações. A população exige urgentemente a vacinação em massa, além de um auxílio emergencial digno e de “verdade” para que essas pessoas não se arrisquem e que seja viável um lockdown!

Comida no prato, e vacina no braço!

Referências da comunidade da vila das Torres citadas no texto:

Valdemilson Osório de Campos – Presidente da Associação de Moradores da Vila das Torres

Padre Joaquim Parron – Redentorista, padre da Capela Nossa Senhora Aparecida

Irmã Claudia Molin – Franciscana Bernardina, responsável pela Capela Nossa Senhora Aparecida

Tanaka – presidente da associação de moradores local

Edição: Pedro Carrano