Minas Gerais

PROJETO MÃOS DADAS

Municipalização das escolas estaduais pode causar desemprego em Betim (MG)

Segundo profissionais da educação, futuro da categoria é incerta, já que metade é contratada pelo estado

Belo Horizonte | Brasil de Fato MG |

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Cerimônia de adesão de Betim ao projeto Mãos Dadas - Créditos da foto: Gil Leonardi/Imprensa MG

A adesão de Betim, cidade da Região Metropolitana de Belo Horizonte, ao projeto Mãos Dadas do governo Romeu Zema (Novo) tem preocupado profissionais da educação, que não sabem o rumo de seus empregos e da qualidade da educação. Na prática, o projeto Mãos Dadas pretende entregar para os municípios a responsabilidade pelas escolas de ensino fundamental, do primeiro ao quinto ano.

A notícia da adesão da cidade de Betim foi divulgada no mês passado. Os impactos para a educação na cidade, ilustram a realidade de outros municípios que também aderiram ao projeto.

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Ao todo, segundo levantamento do Sindicato Único dos Trabalhadores no Ensino de Minas Gerais (Sind-UTE), 15 das 29 escolas estaduais da cidade serão afetadas com a mudança, o que significa 3473 alunos que serão transferidos para escolas do município. Além disso, são centenas de professoras efetivas e contratadas, trabalhadoras do serviço escolar, de secretaria e outras especialidades.

15 das 29 escolas estaduais da cidade serão afetadas

Para Daniela Gonçalves Joaquim, diretora do Sind-UTE e membro da Federação Interestadual dos Trabalhadores em Educação (Fite), a adesão de Betim ao projeto Mãos Dadas, trará prejuízos em várias esferas ao município. “Se tratando da comunidade escolar, ele [o projeto] causa problemas no deslocamento dos alunos, de realocação desses alunos, muitos deles vão ter que sair do seu território, o que pode ter uma série de consequências”, afirma.

A sindicalista cita como exemplo a dificuldade que responsáveis que trabalham terão para levar as crianças para escolas mais distantes de suas casas, além da perda de vínculo que pode interferir no desenvolvimento infantil.

Outro exemplo, seria sobre o transporte escolar que, por mais que seja oferecido pela prefeitura, as crianças são muito pequenas o que demandaria cuidados específicos dentro dos ônibus, sobretudo durante a pandemia em que ainda há a necessidade de manutenção de medidas de segurança sanitária.

O que vai acontecer com as professoras

A falta de transparência tanto do governo estadual quanto da prefeitura é o que mais tem incomodado as profissionais. Segundo Marilza Bonifácio de Oliveira, que é professora nas redes municipal e estadual, falta transparência no projeto e, desde o início, não houve nenhum diálogo com a categoria.

“Não estamos enxergando [o projeto] com bons olhos, porque foi uma proposta construída de forma unilateral, veio de cima pra baixo. Não teve uma construção conosco, que somos profissionais de educação, com o sindicato, não foi respeitada a comunidade escolar, no sentido de um planeamento, de uma organização”, relata Marilza, que também é diretora do Sind-UTE.

É muita incerteza. Os profissionais estão com muito medo

Por causa disso, a professora conta que há uma insegurança enorme sobre o futuro da categoria. “O projeto vai causar desemprego na rede estadual, porque grande parte da categoria é designada, contratada. Para os efetivos, há uma instabilidade, porque não sabemos nosso futuro profissional, se o nosso cargo vai continuar, para qual escola que a gente vai, se seremos remanejados”, ressalta. “É muita incerteza. Os profissionais da minha escola estão com muito medo do que vai acontecer conosco”, completa.

Em Betim, segundo a professora, pelo menos metade dos trabalhadores em educação são contratados e poderiam perder seus empregos com a municipalização. Em todo o estado, segundo levantamento do Sind-UTE, são cerca de 100 mil trabalhadores da rede estadual contratados.

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Contrapartida do Estado

Em audiência pública, realizada na Câmara Municipal de Betim, no último dia 11, a secretária municipal de Educação, Marilene Pimenta, afirmou que o Estado repassará ao município o valor de R$ 69,6 milhões. “Serão construídas oito novas escolas, espalhadas pelas regionais do município. Os projetos foram concluídos e aprovados pelo governo estadual”, disse Marilene.

O termo de adesão ao projeto foi assinado por Betim no dia 26 de maio e, de acordo com informações da secretária, o repasse dos recursos pelo Estado acontecerá dentro do prazo máximo de 45 dias a partir dessa data. “A grande questão é que o Estado assume uma narrativa de falta de recurso, que está quebrado, e de repente, do nada, aparecem esses quase R$ 70 milhões. Se esse recurso fosse investido na educação, as escolas seriam de excelência”, critica Luiz Fernando de Souza Oliveira, diretor do Sind-UTE.

Na época do lançamento, a secretária de Estado de Educação, Julia Sant’Anna, afirmou que o investimento total para a iniciativa será de R$ 500 milhões, recurso já previsto na Lei de Orçamento Anual (LOA) de 2021, que poderá ser usado para a construção de escolas, aquisição de mobiliários, execução de obras e de reformas.

“A gente sabe da crise que o Estado está passando, ou pelo menos fala que está passando, e que ele deixou de investir em educação quase R$ 5 bilhões nos últimos dois anos”, comentou Diego Rossi, assessor técnico do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), em debate online promovido pela deputada estadual Beatriz Cerqueira (PT).

Segundo levantamento do Sind-UTE, quase 100 municípios recusaram a adesão ao projeto de Romeu Zema (Novo). (Leia aqui).

Outro lado

Em nota, a Secretaria de Estado de Educação (SES) de Minas Gerais informa que as escolas estaduais passarão para a gestão municipal a partir de 2022. A SES confirma o valor de R$ 69,6 milhões que será repassado ao município após a completa formalização do convênio, valor que inclui a construção das oito novas unidades.

“Até que os novos prédios fiquem prontos, o atendimento continuará sendo feito nas mesmas unidades atuais, só que pela rede municipal, em regime de coabitação”, diz o texto.

Ainda, segundo nota da SES, “todos os servidores efetivos das escolas estaduais impactadas terão garantia de permanecer no município próprio de lotação. Os professores efetivos do estado poderão optar por continuarem lotados nas escolas que serão absorvidas pelos municípios, em adjunção, com prazo indeterminado e ônus total do estado”.

Em relação aos servidores contratados, a SES afirma que eles “permanecerão sob responsabilidade do estado até o final do ano letivo de 2021, até o final da vigência dos contratos”. 

A Prefeitura de Betim reforça, em nota, que serão construídas oito escolas em “formato moderno”. De acordo com a Secretaria Municipal da Educação, serão recebidos alunos do primeiro ao quinto em regime de coabitação, ou seja, “eles seguirão matriculados nas escolas estaduais até que as obras das novas escolas estejam concluídas”.

Ainda, segundo a prefeitura, o plano prevê a eliminação do analfabetismo funcional, além da distribuição de dez unidades em todas as regionais da cidade, sendo que oito com recursos do Estado. “Com isso, o município irá gerar 12 mil novas vagas. Dessas, pelo menos 6 mil de ensino integral, com um novo modelo de escola que fornece espaço e condições adequadas a crianças em diferentes níveis de aprendizado”, diz a nota. 

Edição: Elis Almeida