Minas Gerais

DESTRUIÇÃO

Projeto de lei na Assembleia ameaça monumento natural e abastecimento da Grande BH

Serra da Moeda é alvo da mineradora e siderúrgica Gerdau

Belo Horizonte (MG) | Brasil de Fato MG |
O PL 3300/2021 retira da área de proteção ambiental 12,81 hectares e, embora a proposta inclua outras áreas de 75,28 hectares, moradores consideram a mudança prejudicial - Reprodução

O monumento natural da Serra da Moeda, a população do município de Moeda e até mesmo o abastecimento de água na Grande BH podem estar sob ameaça por um projeto de lei (PL) que tramita na Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG). O PL 3300/2021, do deputado Tiago Cota (MDB), retira da área de proteção ambiental 12,81 hectares e permite a atuação da siderúrgica e mineradora Gerdau Aço Minas S/A para extrair minério de ferro. Embora a proposta inclua outras áreas de 75,28 hectares, moradores consideram a mudança prejudicial. 

“A área que a mineradora quer explorar é a crista da serra, o topo. É uma área de recarga hídrica. A água absorvida por aquela região alimenta a bacia do Paraopeba e a bacia do Rio das Velhas. Isso tem uma importância grande para comunidades rurais, quilombolas, para agricultura e pecuária”, afirma Sol Bueno, moradora da zona rural e integrante do Coletivo Cauê e do Instituto Aqua XXI. Além disso, as duas bacias afetadas integram o sistema que abastece a Região Metropolitana de Belo Horizonte. 

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O ambientalista Cléverson Vidigal, membro da ONG Abrace a Serra da Moeda, explica que a área que o PL 3300 propõe acrescentar não tem as mesmas propriedades da área almejada pela empresa. Isso, segundo ele, significa que haverá uma perda, em termos de preservação. Cléverson relata que há um histórico de degradação de nascentes pela mineração em geral. 

“Moeda é o único município no Quadrilátero Ferrífero que, por força de leis municipais, proíbe a mineração. Temos um tombamento de 2004, um decreto de 2008 que cria duas reservas biológicas na serra e ainda existe o plano diretor de Moeda que, em seu artigo 37, é veementemente contra a mineração. Então, de uma maneira geral, a população é contra a mineração porque Moeda tem a sua subsistência baseada no turismo”, acrescenta. 

Mineração versus economia local 

Segundo a Gerdau, as operações geram cerca de 5 mil empregos diretos e indiretos na região. Mas, de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), Moeda tem 4689 habitantes e 14,4% da população ocupada. Dados da Relação Anual de Informações Sociais (Rais) mostram que, em 2019, as principais atividades econômicas de Moeda eram a administração pública, com 187 postos, setores de serviços (192), comércio (143) e a indústria de transformação (83). Curiosamente, não havia registro de empregados na indústria extrativa, à qual pertence a mineração. 

Moradores relatam que, muitas vezes, as críticas às mineradoras na cidade são recebidas de maneira preconceituosa, como se opor-se à exploração predatória fosse necessariamente prejudicar a economia e a geração de empregos. A verdade, porém, é que há um conflito entre atividades importantes da economia local, como o turismo, e a exploração predatória pela mineração, que tem impactos profundos na vida da população.

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Para o vereador Ednei Antunes (Solidariedade), os interesses da mineração entram em choque com o desenvolvimento do município. “A mineração vem para destruir a serra. O que o PL 3300 quer é rebaixar a crista da serra, onde tem muitas nascentes. Vamos ter uma cava imensa no desenho da serra, que vai trazer poeira, doença, barulho e um impacto ambiental gigantesco no nosso município, que é pequeno. Nós podemos sobreviver com o turismo, que é para sempre. A mineradora não”, comenta. 

Legislativo 

Com apenas uma semana tramitando na ALMG, o PL 3300 passou pelas comissões de Constituição e Justiça, de Desenvolvimento Econômico e de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável. 

“A população que será atingida com a desafetação e a mudança dos limites não está no projeto. À população não foi dado o direito de nenhuma manifestação, exceto atrás daquele vidro, com seus cartazes feitos de próprio punho. A população não é ouvida. E, votado o projeto nas comissões, ele ficará pronto para ir a plenário no primeiro turno. Mas percebam que, na tramitação, a Gerdau é escutada vastamente, enquanto a população não foi ouvida”, criticou a deputada Beatriz Cerqueira (PT), durante sessão da Comissão de Meio Ambiente. 

Histórico na região 

As operações da Gerdau na região foram iniciadas em 2006, sem a realização dos estudos prévios de impacto ambiental (EIA/Rima). Em 2008, o Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) ajuizou uma ação civil pública, solicitando a interrupção das atividades da empresa, até que fossem realizados os estudos. Na época, o pedido foi atendido pelo Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG). 

Em 2009, a mineradora assinou Termo de Compromisso com o MPMG, prevendo 28 obrigações, entre as quais não solicitar novas licenças para minerar a Serra da Moeda. Entretanto, em 2019, um pedido para expandir e implantar uma nova pilha de rejeitos foi apresentado à Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (Semad). No ano passado, a Semad concedeu à Gerdau uma Licença Operacional Corretiva (LOC) para a atividade principal de lavra a céu aberto até 2026. 

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Além disso, movimentos apontam que a mineradora frequentemente realizou operações sobre o território almejado. “A Gerdau vem sempre tentando minerar nessa área de suma importância. A mineradora nunca cumpriu os termos de compromisso. Em 2017, ela entrou com a sua cava dentro da unidade de conservação Monumento Serra da Moeda”, conta Cléverson Vidigal.   

Outro lado

Por meio de sua assessoria, a Gerdau afirma que “no momento devido, a empresa fará os trâmites de licenciamento em consonância com os órgãos ambientais competentes”. Segundo a mineradora, o acordo firmado em 2009 com o MPMG não foi revisto. O projeto atual seria de continuidade da área de atuação e não solicitação de uma nova área. “O acordo homologado em juízo nada dispôs sobre a temática de alteração dos limites da operação”, afirma a empresa.

Perguntada sobre as medidas de reparação para a exploração dos novos 12,81 hectares, a Gerdau afirma que “a proposta oferece como contrapartida outros 75,28 hectares para comporem a unidade de conservação, que resultará em acréscimo de uma área quase seis vezes maior do que a que será utilizada na continuidade da operação. Desses 75,28 hectares, 31,66 hectares são de área similar à intervenção e 43,62 hectares de área de elevado valor ambiental, que formará um corredor ecológico permanente entre o Monumento e a Estação Ecológica de Arêdes”.

 

Edição: Larissa Costa