Pernambuco

MORADIA

Projeto de Lei da Prefeitura do Recife pode desapropriar imóveis abandonados

O instrumento é visto com bons olhos pelos movimentos de luta por moradia, mas gera dúvidas sobre como será implementado

Brasil de Fato | Recife (PE) |
Organizações que lutam pelo direito à moradia acreditam que para que a implementação do instituto seja eficaz, é preciso que haja vontade política - Inês Campelo/MZ Conteúdo

O prefeito do Recife João Campos (PSB) enviou para a Câmara de Vereadores um projeto de lei que obriga proprietários a dar uso às construções na capital pernambucana, sob pena de perda do patrimônio. O projeto busca garantir a aplicação do princípio da função social da propriedade sobre imóveis abandonados. Através dele, o proprietário pode ser obrigado a parcelar, utilizar ou terminar de construir o imóvel sob pena de aumento no IPTU e até desapropriação. 

A função social da propriedade privada é um princípio previsto na Constituição Federal de 1988 e destaca que ela deve atender um interesse social ou coletivo, e não meramente comercial, como destaca o advogado popular Antônio Celestino. “A cidade não pode ser apropriada enquanto mercado, ela tem vida, ela tem pessoas que precisam gozar de serviços, gozar da cidadania. Sem os elementos garantidores da função social da propriedade, ela acaba sendo completamente absorvida pela perspectiva da propriedade privada e dos interesses de quem as detém”, explica.

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A pauta tem chamado a atenção das organizações que lutam pelo direito à moradia na cidade. Elas acreditam que o instrumento é importante para a população recifense, mas é preciso vontade política e participação popular para a sua implementação.

“O conteúdo dessas propostas não foi discutido de forma democrática, os movimentos sociais, como o nosso, por exemplo, não foram consultados, não fizeram reunião. E nós achamos que é um período muito longo, porque já são anos que tem vários imóveis abandonados, que só tem servido para a especulação imobiliária e até agora o poder público não tomou nenhuma medida, como determina o Estatuto da Cidade”, afirma Kleber Santos, coordenador nacional do Movimento de Luta nos Bairros, Vilas e Favelas (MLB).

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A questão não é nova para a cidade. O instrumento urbanístico já aparecia no Estatuto da Cidade do Recife, de 2001, e na Legislação do Recife desde 1991, mas nunca havia sido regulamentado. “Esse tipo de política de dar exercício ao princípio da função social da propriedade já devia estar acontecendo há décadas. Então, assim, a gente já a recebe com um certo atraso. Recife tem um problema do estatuto fundiário da terra que lhe é muito peculiar, de acrescido de marinha e de terrenos aterrados”, analisa o advogado popular.

Apesar de avaliar a importância da regulamentação, os movimentos questionam se o instrumento vai beneficiar aqueles que lutam pelo direito à moradia ou a especulação imobiliária. “Nós achamos que se for aprovado esse projeto, ela só vai vingar, ela só vai ser colocada em prática se houver vontade política e, sinceramente, nós não acreditamos que esse prefeito tem vontade política para fazer com que os imóveis cumpram a sua função social, uma prova disso é o projeto Recentro, que só fornece alternativa para a especulação imobiliária”, aponta o coordenador nacional do MLB.
 

Edição: Vanessa Gonzaga