Minas Gerais

Coluna

A crise dos mísseis em Cuba

Imagem de perfil do Colunistaesd
Gabriela Lucena - Brasil de Fato
Após eleição de Kennedy aumenta ofensiva contra Cuba

A Revolução Cubana tornou-se o tema central das eleições presidenciais norte-americanas de 1960.

John F. Kennedy, que Fidel havia chamado de um “milionário analfabeto e ignorante”, acusou a administração Eisenhower de permitir que uma “ameaça comunista” se instalasse no hemisfério ocidental. Em discurso de campanha ele disse: “Não ficaremos satisfeitos enquanto a democracia não for restabelecida em Cuba. As forças que lutam pela liberdade no exílio e nas montanhas de Cuba devem ser apoiadas e auxiliadas”.

Já Richard Nixon, republicano e seu adversário, queria manter sigilo sobre uma possível invasão de Cuba caso ganhasse. Mas, à medida que a campanha avançava e esquentava, os dois candidatos pediam apoio para depor Fidel.

Em outubro, Eisenhower suspende todas as exportações dos EUA para Cuba. Em resposta, Fidel confiscou as companhias norte-americanas que ainda restavam em seu território.

Vitória de Kennedy e aumento da ofensiva

Kennedy é eleito em novembro de 1960 e assume em 20 de janeiro de 1961. No dia 3 de janeiro de 1961, os EUA cortam as relações diplomáticas com Cuba. No dia 21 de janeiro, Fidel acreditando que os EUA invadiriam Cuba ameaçou retirar os funcionários da Embaixada Cubana dos EUA. E advertiu os EUA de que, se houvesse uma invasão, significaria uma luta até a morte. Disse Fidel: “Armaremos até os gatos se pudermos ensiná-los como segurar uma arma”.

Após sua eleição Kennedy toma conhecimento sobre os planos secretos do Estado americano para a invasão de Cuba. Ele ainda estava indeciso quanto a ir adiante com o projeto, temendo que, bem ou malsucedida, uma intervenção militar em Cuba resultasse num revés político e moral para os EUA na América Latina e no mundo.

:: Leia os outros artigos de Antonio Manoel Mendonça de Araujo da série sobre a Revolução Cubana :: 

Mas, a nova administração e Secretários de Estado apoiavam a invasão, além do Chefe da CIA. Garantiam a Kennedy que a invasão seria recebida com um levante popular contra Fidel. Cancelar a operação seria expor seu governo a duras críticas do Congresso. Kennedy então, ordena que a CIA continue com os preparativos para a invasão.

A tentativa de invasão

Em março de 1961, tudo estava pronto para a invasão. A CIA apressara a remessa de armas para os contrarrevolucionários nas montanhas de Cuba. Além disso, as sabotagens nas cidades de Cuba haviam aumentado. Em 13 de março de 1961, Kennedy revela seu plano “Aliança para o Progresso”, um pacote multimilionário de ajuda aos países da América Latina. Buscava conquistar a boa vontade dos países da América Latina, antes de Cuba ser invadida.

Em 15 de abril de 1961, vários aviões pilotados por exilados cubanos bombardearam o campo de aviação, bem como os quartéis militares de Cuba. No entanto, Fidel havia escondido sua pequena frota aérea e colocado outros aviões como isca, bem à vista. Os danos materiais da Força Aérea Cubana (FAC) foram leves, embora sete pessoas tenham sido mortas e quarenta e quatro ficaram feridas no ataque.

Em 17 de abril de 1961 a primeira lancha dos invasores desembarca na ilha

Na noite do dia 16 de abril de 1961, 1.500 homens de uma força invasora, embarcam para Cuba, por meio de Puerto Cabezas, na Nicarágua. O ditador nicaraguense Anastasio Somoza, em tom de deboche, pede que lhe tragam alguns pelos da barba de Fidel.

O destino desses invasores era a Baía dos Porcos, na Costa Sul de Cuba, onde existia uma imensa extensão de pântanos traiçoeiros. Existia apenas uma pequena faixa de terra com espaço suficiente para instalar um posto de comando entre a praia e os pântanos. Os invasores, acreditando terem destruído a FAC, pensaram que o local de desembarque estaria livre de qualquer ataque aéreo. Ledo engano.

Derrota dos invasores

Na manhã do dia 17 de abril, quando a primeira lancha dos invasores desembarcou na praia, encontraram forte resistência. A milícia local, após ser alertada por sentinelas, entram em ação imediatamente. Além disso, um batalhão do exército que estava a 30 km do local do ataque, foi avisado da invasão.

O que os invasores não sabiam é que a revolução havia melhorado consideravelmente a vida de grande parte da população cubana que, portanto, era bastante leal ao regime de Fidel.

Fidel, sabendo da invasão às 3h15min da madrugada, foi de avião pessoalmente dirigir as operações militares. As milícias das províncias vizinhas e os outros batalhões do Exército foram rapidamente mobilizados.

O Exército Cubano ataca os navios inimigos, desencadeando um esmagador bombardeio sobre eles. A operação afundou vários navios e obrigou o que restou a se retirar para longe da costa.

:: Leia mais notícias do Brasil de Fato MG. Clique aqui ::

No dia seguinte, os invasores se viram cercados. Ao perceber o fracasso, Kennedy nega-se a empregar fuzileiros navais norte-americanos ou mesmo permitir que aviões dos EUA realizassem ataques aéreos contra as tropas de Cuba.

Na manhã do dia 19 de abril de 1961, as forças cubanas começaram a fechar o cerco em torno dos invasores sitiados. Ao todo, 129 invasores morreram e 1.180 foram feitos prisioneiros. Por parte do Exército Cubano 87 homens morreram em combate.

Alguns dias após a prisão dos invasores, esses são levados a um campo de esporte, onde Fidel manteve com eles uma discussão por cinco horas que foi televisionada. Os temas tratados abrangiam uma grande quantidade de questões sociais e políticas. Um dos prisioneiros acusou Fidel de haver escondido dinheiro nos bancos da Suíça; outro argumentou que a democracia seria melhor que o socialismo; um terceiro disse que Fidel havia traído os sonhos da revolução.

Fidel responde enumerando o progresso da sociedade cubana desde a revolução. E terminando argumentando: “sejam honestos, certamente perceberão que são os primeiros prisioneiros na História a ter o privilégio de argumentar com o governo que vieram derrubar”.

Cuba se aproxima da URSS

O grande fiasco norte-americano na Baía dos Porcos foi um triunfo pessoal de Fidel Castro e um divisor de águas político para a Revolução Cubana. No dia 1 de maio de 1961, Fidel anunciou que Cuba era “um Estado marxista-leninista”.

A tensão entre Cuba e EUA iria se agravar em janeiro de 1962, quando a Organização dos Estados Americanos (OEA), respondendo a uma proposição norte-americana, expulsa Cuba dessa organização usando como argumento a “beligerância revolucionária” cubana.

Em 26 de julho de 1962, ao comemorarem o 9º Aniversário do ataque ao Quartel em Moncada, Fidel falou veementemente sobre uma iminente invasão do país pelos EUA. A persistente ofensiva política e econômica norte-americana contra a revolução mantinha Cuba em permanente estado de ansiedade.

Jornal Revolución trouxe a manchete: “A nação em pé de guerra”

A hostilidade entre Cuba e EUA reforçou a importância de novas relações com a URSS. Cuba até aquele momento mantinha-se imparcial na guerra fria entre EUA e URSS. Mas agora se vira levada a se alinhar com mais clareza ao campo soviético.

No mesmo mês de julho, Raul Castro visita o Primeiro-Ministro Soviético, Nikita Kruschev, no Kremilin. Ele retorna a Cuba com a promessa de que a URSS supriria Cuba om mais armas defensivas, inclusive mísseis nucleares de longo e médio alcance.

Crise dos mísseis

A crise dos mísseis, chamada pelos cubanos de Crisis del Caribe, desenrolou-se por um período de seis dias cheios de tensão e suspense.

Kennedy, em 22 de outubro, após receber fotografias de aviões espiões que provavam a existência dos mísseis, declara ser “inaceitável” os estoques de mísseis soviéticos em Cuba.

Estabelece então um bloqueio naval da ilha para prevenir desembarques de mais armas soviéticas. Dezesseis contratorpedeiros norte-americanos foram alinhados para fiscalizar e bloquear, caso necessário, qualquer navio soviético em rota para Cuba que fossem capaz de transportar armas ofensivas. Além disso, pediu aos soviéticos que retirassem todos os mísseis já montados.

No dia seguinte, após o discurso de Kennedy, Fidel ordenou um estado de mobilização geral em Cuba. O jornal Revolución trazia a seguinte manchete: “A nação em pé de guerra”. Na televisão, Fidel discursa: “Isso aconteceu simplesmente porque até agora, todas as tentativas dos Estados Unidos para destruir nossa revolução terminaram em fracasso. O que fizemos? Temos nos defendido. Isso é tudo!”

Em 26 de outubro de 1962, quatro dias depois, Kruschev concordou em retirar os mísseis se os EUA prometessem não invadir Cuba. Os EUA aceitaram prontamente e, em 28 de outubro, Kruschev anunciou que os mísseis seriam retirados.

:: Receba notícias de Minas Gerais no seu Whatsapp. Clique aqui ::

Fidel não havia sido consultado, então, em um comício na Universidade, ele acusa Kruschev de “não ter coragem”. Para a maioria dos cubanos Kruschev havia traído Fidel e a revolução.

Essa crise dos mísseis cubanos, desencadeou enorme crítica na carreira desses três líderes envolvidos. Kruschev enfrentou séria oposição dentro do Kremilin, tendo sido afastado dois anos depois. Kennedy ganhou muitos aplausos pela maneira como comandou a negociação. E Fidel não sofreu nenhuma perda de popularidade, mas, depois disso, ele ficou prevenido ao constante perigo que consistia estar incluído no jogo do poder político internacional.

Antonio Manoel Mendonça de Araujo é professor de Economia, conselheiro do Sindicato dos Economistas de Minas Gerais (Sindecon) e ex-coordenador da Associação Brasileira de Economistas pela Democracia (ABED-MG)

---
Este é um artigo de opinião. A visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do jornal

 

Edição: Elis Almeida