Rio Grande do Sul

CONSTRANGIMENTO

Justiça determina interdição de unidade da FASE e remoção de servidores

A ação ajuizada pela Defensoria Pública aponta inúmeras irregularidades no Centro de Atendimento Socioeducativo Feminino

Brasil de Fato | Porto Alegre |
A interdição será por dez dias, prorrogáveis por mais dez, do Centro de Atendimento Socioeducativo Feminino (CASEF) - Foto: IStock

A juíza da 3ª Vara do Juizado da Infância e Juventude do Foro Central da Comarca de Porto Alegre, Karla Aveline de Oliveira, deferiu, nesta segunda-feira (13), a interdição por dez dias, prorrogáveis por mais dez, do Centro de Atendimento Socioeducativo Feminino (CASEF). A magistrada também determinou a remoção de servidores que atuam no complexo da Vila Cruzeiro, em Porto Alegre. A ação foi ajuizada pela Defensoria Pública do Rio Grande do Sul (DPE/RS), no dia 8 de março. Confira a íntegra da decisão.

Na ação os defensores públicos Paula Simões Dutra de Oliveira, Rodolfo Lorea Malhão e Fernanda Sanchotene apontam inúmeras irregularidades que eram cometidas no local, que abriga, atualmente, sete meninas em cumprimento de medidas socioeducativas.Os defensores destacam que as internas eram proibidas de conversar entre elas sobre assuntos pessoais e só podiam falar na presença de agentes. Outro fato que chamou a atenção é de que elas não poderiam realizar qualquer demonstração de afeto, como se abraçar, por exemplo. No entendimento dos servidores, segundo os relatos, as meninas não estavam no local para serem amigas.

“No CASE feminino, desde 2018 lutamos contra o regime mais rigoroso que é dispensado às adolescentes mulheres com relação aos socioeducandos homens, em igualdade de condições. As mulheres sofrem com o hipercontrole dos corpos e das roupas, além da hipervigilância do comportamento e das conversas. Ao passo em que os meninos podem usar suas próprias roupas e conversar com os seus pares sobre suas vidas, as meninas não podem usar suas roupas por serem curtas ou justas, a pretexto, dentre outras coisas, de que homens trabalham na unidade”, expõe o defensor público Rodolfo Malhão. 

O defensor pontua que elas também sofrem uma grande cobrança com relação às atividades de limpeza, que não são cobradas dos homens em iguais condições. “Ainda precisam se submeter à avaliação de suas condutas, na frente de todos, sem que tenham direito à voz nesses momentos. Tais condutas já foram objeto de, ao menos, três ações judiciais e de incontáveis tratativas extrajudiciais, sem que o problema fosse resolvido. Fruto de um conceito machista e de necessidade de submissão da mulher. Entendemos, assim, que não restava alternativa a não ser a interdição da unidade, com alteração do quadro de servidores, a fim de que as meninas pudessem exercer seus direitos em igualdade com os homens” descreve. 

Os defensores apontam que para realizar necessidades básicas, como ir ao banheiro, tomar água ou lavar os pratos após as refeições, elas tinham que ter autorização. Ainda segundo relato, as internas passavam por revistas e agachamentos, antes e depois da visita de familiares, o que fere totalmente o disposto no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), por se tratar de uma prática vexatória.

Problemas na Unidade não são de agora

Segundo os defensores, os problemas na Unidade não são de agora. Há pelo menos quatro anos, eles identificaram práticas irregulares, sendo que algumas foram resolvidas de maneira extrajudicial e outras judicialmente. Como os problemas persistiram, a ACP foi ajuizada.

Para a defensora Paula, o regramento imposto extrapola as limitações inerentes à restrição de liberdade. “Ao longo de um intenso trabalho promovido junto ao CASEF, percebeu-se que práticas que há muito vinham sendo combatidas nunca deixaram de ser aplicadas. O relato das jovens, perante integrantes do sistema de Justiça, foi bastante contundente no sentido de confirmar que um regramento rigoroso era imposto. As regras estabelecidas atingiam a dignidade e representavam, muitas vezes, situações de exposição e constrangimento”, relata. 

Ela afirma que, muito embora em outros momentos tenha se optado pela via conciliatória e extrajudicial, a revisão de condutas de fato não foi implementada, reclamando intervenção do Poder Judiciário para que se obtivesse um resultado efetivo. 

Na decisão, a juíza ressalta o pedido feito pela DPE/RS e determina que os atuais servidores devam ser substituídos da unidade por servidores que tenham assumido a função após 18 de janeiro de 2012, data da publicação da lei do Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (Sinase), que dispõe sobre regras gerais de como as medidas socioeducativas devem ser executadas.

No ano passado a entidade solicitou o afastamento de servidores da FASE suspeitos de agressão a menores. 

Posição da FASE

Em nota à imprensa, a Fundação de Atendimento Sócio-Educativo (FASE) informa que está averiguando os fatos trazidos na presente ação e os encaminhamentos necessários para o cumprimento do despacho, em sede de decisão liminar, já estão sendo cumpridos.

Esclarece ainda que não haverá prejuízo ao atendimento das adolescentes atualmente em cumprimento de medida socioeducativa no CASEF, ressaltando o compromisso da Fundação na garantia dos direitos dos adolescentes.


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Edição: Katia Marko