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Lítio no Jequitinhonha: mais exploração para elites estrangeiras

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Sem diálogo com a população, Zema o Vale do Jequitinhonha para Nova Iorque como "Vale do Lítio" - Foto: Adré Cruz/ Imprensa MG
Exploração do lítio degradará solo e água

O governador Romeu Zema lançou na Nasdaq, a maior bolsa de valores do mundo em negócios de tecnologia e inovação, em Nova Iorque, nos Estados Unidos, o projeto Vale do Lítio (Lithium Valley Brazil). 

Segundo o secretário de Estado de Desenvolvimento Econômico, Fernando Passalio, o projeto busca atrair diversos atores da cadeia produtiva do lítio para o Vale do Jequitinhonha, de onde será possível extrair, beneficiar e fabricar os produtos que vão abastecer mercados em todo o mundo.

Por um momento, o sugestivo nome lembrou-me o famoso Vale do Silício na Califórnia, Estados Unidos. Com uma grande diferença, o Vale do Silício não extrai a sílica. O nome é o apelido da região da baía de São Francisco onde estão situadas várias empresas de alta tecnologia, destacando-se na produção de circuitos eletrônicos, na eletrônica e informática, industrias essas que se utilizam do silício em seus componentes.

Por seu turno, o Vale do Jequitinhonha, rebatizado por Zema como Vale do Lítio, terá como carro chefe da cadeia produtiva a mineração do lítio, metal indispensável na produção de baterias de longa duração, que equipam veículos elétricos e aparelhos eletroeletrônicos. De modo que, segundo o governador, estaríamos contribuindo para substituição dos combustíveis fósseis pela chamada “energia limpa”.

:: Veja também: Minas Gerais à venda em Nova Iorque::

O Vale do Lítio é formado por 14 cidades: Araçuaí, Capelinha, Coronel Murta, Itaobim, Itinga, Malacacheta, Medina, Minas Novas, Pedra Azul, Virgem da Lapa, Teófilo Otoni e Turmalina, no Nordeste de Minas, e Rubelita e Salinas, no Norte mineiro. Municípios esses que abrigam a maior reserva nacional de lítio.

“Como é miúda e quase sem brilho, a vida do povo que mora no Vale”, cantou o poeta. No entanto, as cidades do Vale são identificadas pelos nomes dos minerais e das pedras que delas sempre foram extraídas. Ocorrerá diferente com a exploração do lítio? Quanta poluição e destruição será necessária para sustentar a “energia limpa”?

Zema segue passando a Boiada

Em reportagem do Diário do Comércio em 2022, a Latin Resources se disse entusiasmada com as oportunidades que a exploração de lítio em nosso Estado e enalteceu as características de Minas Gerais, afirmando que o Estado é bem servido de infraestrutura, estradas, energia hidrelétrica, água e que conta com o auxílio do porto de Vitória (ES). “O Estado é particularmente eficiente na emissão de licenças de perfuração e aprovações ambientais”.

Assim como qualquer outra atividade de mineração, os processos de extração, refino e descarte do lítio também agridem o meio ambiente, causando degradação do solo, perda de biodiversidade, contaminando a água, o ar e afetando a vida das pessoas e comunidades.

Estima-se que até o fim desta década o consumo mundial de lítio para baterias de carros eletrificados deverá crescer de atuais 350 mil para 3 milhões de toneladas por ano.

O alto consumo de água, recurso cada vez mais escasso no mundo, é o ponto mais crítico das preocupações. De acordo com matéria do Observatório Automotivo de agosto de 2022, são necessários em média 2,1 milhões de litros d’água para refinar cada tonelada de lítio – quantidade suficiente para produzir as baterias para cerca de oitenta carros elétricos como o Tesla Model S com seu módulo de baterias que tem 12 quilos de lítio.

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Como disse em artigo anterior deste jornal, o velho Zema segue maquiando de Novo as velhas ideias. Esconde os prejuízos e os riscos e expõe as supostas vantagens de um projeto de desenvolvimento notoriamente antigo e predatório, o extrativismo mineral.

Desde a sua “formação” como espaço econômico, as Minas Gerais foram e vem sendo um território de extração de riquezas naturais não renováveis. Um modelo de economia que cresce para atender aos interesses de poucos, pouquíssimos, e que deixa atrás de si um rastro de destruição.

Triste fim do Vale do Jequitinhonha. Vítima de uma trágica história, uma vez que desde os seus primórdios o Vale é um território marcado pela exploração desenfreada de seus recursos minerais para a satisfação de elites estrangeiras e nacionais e pelo fracasso de um projeto civilizacional baseado na mineração.

 

 

Dimas Antonio de Souza é professor de ciência política do Instituto de Ciências Sociais da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC Minas) e escreve quinzenalmente para esta coluna. Twitter: @prof_Dimassouza;  Instagram: @prof.dimasoficial

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Leia outros artigos de Dimas Antonio de Souza em sua coluna Vela no Breu, no Brasil de Fato.

 

Edição: Elis Almeida