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Banco Copasa: a mão invisível que fecha as torneiras e enche os bolsos

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A Copasa bateu o seu recorde de lucro em 2022, faturando R$ 843,4 milhões - Foto: Divulgação/ Copasa
É inaceitável que a empresa privilegie pouquíssimos acionistas ao invés de uma população inteira

A Companhia de Saneamento de Minas Gerais (Copasa) encontra-se atualmente imersa em um preocupante processo de financeirização, que a tem transformado em um banco ao invés de uma empresa dedicada ao saneamento. Essa tendência é extremamente prejudicial, compromete a qualidade dos serviços oferecidos e afeta diretamente a população mineira.

Rastros disso podem ser vistos até mesmo no simbolismo linguístico. Termos como EBITDA, Capex, Opex e todo o vocábulo do mercado financeiro têm substituído palavras como água, obras, disponibilidade, contas baixas ou mesmo trabalhadores (que é quem faz o processo acontecer).

É fato que a Copasa tem direcionado uma parcela considerável de seus recursos para operações financeiras, em detrimento dos investimentos em infraestrutura e melhorias nos serviços de saneamento. Pelos últimos dados, o lucro bateu recordes, saindo de R$ 537,6 milhões, em 2021, para R$ 843,4 milhões, em 2022.

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Essa priorização das atividades financeiras em detrimento do cumprimento de sua missão social é alarmante. A população mineira é a mais prejudicada por essa filosofia empresarial inadequada, pois enfrenta problemas constantes no fornecimento de água potável e de saneamento básico de qualidade.

Além disso, as tarifas cobradas pela Copasa têm aumentado significativamente, pesando no orçamento das famílias, especialmente daquelas de baixa renda, e claro, políticas sociais, como tarifa social, têm sido secundarizadas na empresa, que prefere o agravamento da inadimplência das populações vulneráveis do que adequação da tarifa ao bolso dos consumidores.

Sequer há sistemas de parcelamentos inteligentes, o que economizaria para a empresa e para a população milhões de reais que são gastos com campanhas publicitárias anuais, como a “black friday”, que a Copasa chama de “dias azuis”, mas na verdade deveria se chamar “sempre no vermelho”. Essa prática visa o lucro dos rentistas e investidores com base na inadimplência. É evidente a semelhança com a prática dos bancos.

No contexto da Copasa, além dos dados financeiros, é importante mencionar os pagamentos de juros sobre capital próprio (JCP) e dividendos, que têm um papel relevante no processo de financeirização. O direcionamento desses recursos para os acionistas, em vez de serem investidos na melhoria dos serviços de saneamento, é um exemplo claro de como os JCP e dividendos podem ser prejudiciais quando priorizados em detrimento do interesse público.

Há uma tendência preocupante de descaso com o setor de saneamento e um foco excessivo nos resultados financeiros de curto prazo. A influência política também desempenha um papel fundamental nesse contexto, com interferências e interesses pessoais que comprometem a missão social da empresa.

O governador, que até então seria a “renovação” com indicações técnicas e meritocráticas, acabou fazendo o mesmo que criticava: indicou assessores diretamente ligados ao seu campo político, um deles inclusive é ex-deputado. Sem transparência no recrutamento, Zema escolheu pessoas sem experiência no funcionalismo ou na academia.

Os executivos da Copasa não podem ficar isentos de críticas desse cenário. A busca incessante por resultados financeiros imediatos, em detrimento dos investimentos necessários em infraestrutura e tecnologia, revela uma falta de comprometimento com a melhoria dos serviços de saneamento. A população mineira merece uma empresa que esteja genuinamente comprometida em fornecer água potável de qualidade, tratamento de esgoto eficiente e tarifas justas, menores, e inovações no setor.

É importante destacar a responsabilidade do governador e demais autoridades políticas na gestão da Copasa. A falta de fiscalização adequada, a influência política e as decisões que priorizam interesses financeiros em detrimento do interesse público são falhas graves que devem ser questionadas e corrigidas pelos órgãos responsáveis e pela sociedade civil organizada.

É fundamental que a empresa volte a focar em seu propósito original, priorizando os interesses da população e garantindo o acesso a serviços essenciais de qualidade. Bancos são bancos e saneamento é saneamento. É inaceitável que a empresa privilegie pouquíssimos acionistas ou executivos, ao invés de uma população inteira e dos trabalhadores.

 

 

Lucas Tonaco é acadêmico na área de antropologia e antropologia social, ciências humanas e ciências sociais na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), secretário de comunicação da Federação Nacional dos Urbanitários (FNU), diretor de comunicação do Sindágua-MG e membro fundador da Frente de Comunicação Urbanitária.

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Este é um artigo de opinião. A visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do jornal.

Edição: Larissa Costa