Minas Gerais

PRECARIZAÇÃO

Sete meses depois da privatização, trabalhadores do metrô de BH relatam abusos e desrespeito

Corte de direitos e violação da CLT estão entre as denúncias feitas pelos metroviários

Belo Horizonte (MG) | Brasil de Fato MG |
665 funcionários já foram demitidos por adesão ao Plano de Demissão Voluntária (PDV), elaborado pela companhia, ou por justa causa. - Foto: Sarah Torres/ ALMG

Falta de diálogo, práticas antissindicais, autoritarismo, desrespeito ao acordo coletivo. Essas são algumas denúncias realizadas pelos metroviários de Belo Horizonte, desde que o metrô foi privatizado oficialmente, em março de 2023.

A negociação de venda aconteceu por mediação do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e do governador de Minas Gerais, Romeu Zema (Novo), em dezembro do ano passado, quando o grupo Comporte efetuou a compra da antiga Companhia Brasileira de Trens Urbanos (CBTU) por R$ 25,7 milhões.

Nos últimos sete meses, segundo o Sindicato dos Empregados em Transportes Metroviários e Conexos de Minas Gerais (Sindimetro-MG), 665 funcionários já foram demitidos por adesão ao Plano de Demissão Voluntária (PDV), elaborado pela companhia, ou por justa causa.

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Esse número, de acordo com Alda Lúcia Fernandes dos Santos, presidenta do Sindimetro-MG, reflete a insatisfação dos trabalhadores. “A empresa queria diminuir o quadro, queria tirar mil pessoas para recontratar nos parâmetros dela”, relata. Para as contratações, segundo Alda, a Metrô BH passou a abrir recrutamentos como pessoa jurídica (PJ).

Decisões autoritárias

Mesmo com a prerrogativa de que os sindicatos existem para representar os interesses dos trabalhadores e fazer fiscalizações, Alda lembra que as práticas antissindicais cometidas pela empresa começam ao impedir a ação do Sindimetro-MG.

“A empresa não permite que o sindicato vá às suas bases. Para podermos entrar, temos que avisar o dia e a hora. Mas o papel do sindicato é fiscalizar, saber o que está errado e o que está certo. Se eu combinar o horário e tiver alguma coisa errada, ela vai consertar. E com certeza o empregado não vai falar. As pessoas se sentem inseguras para fazer greve”, observa.

Alda conta ainda que os funcionários são vigiados a todo momento. “Todo mundo vê a hora que você vai ao banheiro, quantas vezes você foi, se você está demorando. Isso está acontecendo com os empregados”, descreve.

Ataques a direitos e aumento da jornada de trabalho

No Acordo Coletivo de Trabalho (ACT), a categoria pleiteava a manutenção dos benefícios adquiridos ao longo dos anos. No texto, mais de 70 cláusulas descreviam as reivindicações dos trabalhadores, mas, como contraproposta, a Metrô BH apresentou outra versão com apenas 17 itens, cortando diversos benefícios.

“Cortaram, por exemplo, o horário especial para mães lactantes”, diz Camila Maira Pinto Cristeli, integrante da diretoria do Sindimetro-MG.

No caso dos maquinistas, a alteração da jornada de trabalho foi de 6h para 8h. Para integrantes do Centro de Controle Operacional (CCO), a carga horária saltou de 8h para 12h.

Na avaliação de Camila, essa mudança traz riscos para os usuários, porque a quantidade de horas trabalhadas pode gerar uma fadiga maior aos profissionais, que muitas vezes têm funções de plena atenção. “Os servidores estarão mais cansados ao fim do turno de trabalho, podendo ter falhas humanas”, analisa.

No que diz respeito à escala de trabalho, Alda denuncia que empresa implementou a chamada “jornada espanhola”, na qual os metroviários alternam entre 48 horas trabalhadas em uma semana e 40 horas na outra. “Mas isso não é legalizado. Para ser legalizado, teria que ser negociado com o sindicato. Então a empresa pratica uma coisa ilegal e prejudica os trabalhadores”, critica.

Mais direitos retirados

A falta de interesse pelo diálogo com o Sindimetro-MG impede que haja uma solução efetiva para os problemas enfrentados por trabalhadores, de acordo com Alda. A maior covardia, para a sindicalista, foi a retirada das cadeiras do bloqueio, região onde ficam as catracas. Agora, os trabalhadores têm que trabalhar oito horas de pé.

“A questão da cadeira é muito séria. Não há interesse da empresa em conversar. É o pior assédio possível. É sabido, pela Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT), que a pessoa tem direito à cadeira, nem que seja a cada dez minutos”, afirma.

No ACT, feito ainda na época em que CBTU administrava o transporte, havia uma cláusula na qual o funcionário tinha direito de acompanhar seus familiares em hospitais, 15 dias ao ano.

“Agora, isso não existe mais. Posso até ir, mas terei minhas horas descontadas. A empresa também não aceita atestados psicológicos, de fisioterapia. Você pode fazer tudo, mas vai ter horas descontadas”, detalha a presidenta.

Deliberações

Um Projeto de Lei (PL), de autoria do deputado federal Túlio Gadelha (RedeE), com emenda do deputado federal Rogério Correia (PT), tramita na Câmara dos Deputados e prevê a possibilidade de resolução de algumas reivindicações dos metroviários. Se o texto for aprovado, permitirá o retorno dos trabalhadores concursados do metrô de Belo Horizonte à CBTU, em suas subsidiárias, ou o reaproveitamento desses funcionários em outros órgãos públicos.

No dia primeiro de novembro, uma audiência pública será realizada no Tribunal Regional do Trabalho de Minas Gerais (TRT-MG), com o objetivo de reforçar o apelo de categoria para o retorno à estatal.

Além dessa agenda, o Sindimetro-MG busca, administrativamente, via Ministério das Cidades, Ministério da Gestão e Inovação, Ministério do Trabalho e Emprego e Casa Civil, a criação de um grupo de trabalho (GT) para discutir a questão.

Outro lado

A Metrô BH foi procurada para comentar as denúncias, mas não respondeu até o fechamento desta matéria. O espaço segue aberto para manifestações.

Edição: Larissa Costa