Minas Gerais

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Em Ipatinga (MG), população resiste à privatização da água e saneamento

Aumento das tarifas, perda de qualidade e piora das condições de trabalho podem ser consequências

Belo Horizonte (MG) | Brasil de Fato MG |
Imagem da Copasa de Ipatinga - Foto: Instagram/ @defesaagua_ipatinga

Nas últimas semanas, movimentos populares e sindicatos de Ipatinga, cidade localizada no Vale do Aço mineiro, têm intensificado as mobilizações em defesa do caráter público do abastecimento de água e do saneamento do município. As movimentações começaram após o prefeito Gustavo Nunes (PL) convocar às pressas uma audiência pública para debater sobre uma possível privatização dos serviços.

A reunião, na qual foram apresentadas propostas para um Plano Municipal de Saneamento Básico (PMSB), aconteceu no dia 22 deste mês. Em resposta, o Comitê Popular em Defesa da Água de Ipatinga publicou uma nota, criticando medidas já tomadas pela prefeitura.

Por exemplo, o movimento denuncia a aprovação, sem participação popular, da Lei Municipal 4432/22, que permite a contratação de empresas privadas de saneamento. “O problema é que a população não pôde opinar sobre nenhuma dessas medidas. E pior, tudo indica que o prefeito quer privatizar a água”, diz o comitê.

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Na segunda-feira (27), a Comissão de Assuntos Municipais e Regionalização da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) também realizou uma audiência pública no município para debater sobre a situação.

Entenda

Já faz quase dois anos que Ipatinga não possui contrato de saneamento básico vigente. Isso porque, o prefeito do município optou pela não renovação da concessão com a Companhia de Saneamento de Minas Gerais (Copasa), que se encerrou em fevereiro de 2022. Ainda assim, a estatal continuou prestando serviços na cidade.

Agora, a prefeitura prepara uma nova licitação para que outras empresas ofereçam seus serviços.

Marcelo Mendes, que é diretor do Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias da Purificação e Distribuição de Água e em Serviços de Esgotos de Minas Gerais (Sindágua) no Vale do Aço, destaca que a Copasa tem condições de seguir sendo responsável pelo abastecimento hídrico e saneamento do município.

“O plano municipal de saneamento, que foi apresentado para a gente, mostra que a Copasa tem plenas condições de atender às demandas que a prefeitura está exigindo. Então, a gente fica até com um pouco de receio sobre o processo de licitação, de que ele coloque alguma cláusula que impeça a empresa de participar”, comenta Marcelo.

Disputa da opinião pública

O diretor do Sindágua ainda denuncia que, assim como o governador de Minas Gerais, Romeu Zema (Novo), o prefeito de Ipatinga busca convencer a opinião pública de que os serviços prestados pela Copasa são ineficientes, ainda que os números mostrem o contrário.

“Existe a tentativa de passar uma imagem de que a Copasa é uma empresa ineficiente e de que ela não será capaz de atender a população nesse novo contrato. Não só o prefeito tem feito isso, mas o nosso governador também, mesmo ela apresentando números exorbitantes de lucro. A gente percebe isso pelas várias entrevistas que o prefeito dá, depoimentos, postagens nas suas redes sociais”, relata Marcelo.

Atualmente, Ipatinga possui 99% da água e 92% do esgoto tratados. Já o lucro da Copasa atingiu R$ 843 milhões, apenas no ano passado.

Criação de agência reguladora

Os movimentos ainda criticam a criação da Agência Reguladora Intermunicipal de Saneamento Ambiental (Arsamb), um consórcio que poderá contratar, fiscalizar e definir as tarifas de abastecimento de água.

Para a vereadora de Ipatinga, Cida Lima (PT), esse já é um dos passos para a privatização. “Essa agência vai passar a cuidar de praticamente tudo relativo ao saneamento no município. Inclusive, essa agência tem o poder de criar vários cargos comissionados e, antes mesmo de ter passado o projeto pela Câmara Municipal, para ratificar a criação da Arsamb, o prefeito já era o presidente dela”, comenta.

Impactos da privatização

Mesmo diante dos números positivos, quem critica a entrada da iniciativa privada na oferta do serviço teme que o município retroceda na garantia de água e saneamento como direito.

O motivo é que, em outras experiências, espalhadas pelo país, de privatização do serviço, o resultado foi diminuição da qualidade, aumento das tarifas, terceirização e precarização das condições dos trabalhadores.

“Me preocupa muito porque, em vários municípios do Brasil, a privatização tem acontecido e o que vemos é o serviço de saneamento piorar e as altas nas tarifas. Isso é preocupante. A água é um bem essencial para a população, é um bem público”, avalia a vereadora Cida Lima.

Em Manaus, por exemplo, onde o serviço é privatizado há mais de 20 anos, a realidade, segundo Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento (SNIS 2020), é de 80% da capital amazonense sofrendo com falta de esgotamento sanitário.

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Outro lado

Em matéria publicada em seu site, a prefeitura de Ipatinga afirma que o Plano Municipal de Saneamento Básico (PMSB) está em “fase de finalização dos estudos” e que a revisão contou com a participação de “especialistas do setor e, ainda, uma consulta pública à população”.

A prefeitura ainda diz que as principais mudanças propostas pelo PMSB incluem “a ampliação da cobertura dos serviços de saneamento básico em áreas ainda não atendidas; a melhoria da qualidade da água e do esgoto tratados; a modernização dos sistemas de gestão e monitoramento, e o estímulo ao uso de tecnologias mais eficientes e sustentáveis”.

Por fim, o Executivo municipal afirma que, ao final da avaliação do plano, será encaminhado um Projeto de Lei (PL) à Câmara Municipal.

Edição: Larissa Costa