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Artigo | Manter a Copasa pública é decisivo para reduzir desigualdades e garantir direitos

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Falta de saneamento afeta mais mulheres, negros e trabalhadores da periferia

Não foram poucas as vezes em que o governador Romeu Zema (Novo) fez discursos contra a Cemig, Copasa e Codemig, em especial propondo a privatização.

Sem demonstração de evidência alguma sobre quaisquer benefícios das privatizações, Romeu Zema enviou para a Assembleia Legislativa de Minas Gerais, em setembro de 2023, projeto de lei para retirar da Constituição do Estado de Minas Gerais mecanismos de defesa das estatais. Zema quer acabar com a obrigação de consulta a população mineira para que ela autorize ou não a venda das estatais.

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Consulta ao povo

Essa obrigação foi incluída na Constituição estadual pelo ex-governador Itamar Franco, em 2001, tendo sido relator Rogério Correia (PT), então deputado estadual. Nada mais democrático que consultar diretamente a população sobre a venda de empresas que são, a rigor, do povo. Aliás, segundo pesquisa recente, cerca de 60% dos mineiros são contra a privatização dessas empresas.

Retirar o povo da jogada, seria o atalho mais simples para Zema rumo as privatizações. Contra essa medida autoritária, organizações populares estão construindo um Plebiscito Popular em Defesa das Estatais de Minas Gerais. Essa consulta vai ocorrer de 19 de abril a 1º de maio deste ano, e a organização da votação será feita por comitês que estão sendo construídos por voluntários nas cidades.

Copasa é referência no Brasil e no mundo

No saneamento público, a Companhia de Saneamento de Minas Gerais (Copasa) e a Serviços de Saneamento Integrado do Norte e Nordeste de Minas Gerais S/A (Copanor) são referência em prestação de serviços de saneamento no Brasil e no mundo.

A Copasa, com 61 anos de existência, é uma empresa pública que atua no setor de saneamento básico em Minas Gerais, responsável pelo abastecimento de água, esgotamento sanitário e coleta de lixo em 634 localidades do estado. Segundo dados de 2022, a empresa tem ativos de R$13,2 bilhões, faturamento de R$6,73 bilhões e lucro de R$ 843 milhões.

A empresa foi criada tendo em vista o papel das estatais nas reformas estruturais econômicas com o objetivo de resolver gradativamente a necessidade de infraestruturas de urbanização no bojo do Plano Nacional de Saneamento (PLANASA) de 1971.

Em 2007, foi criada a Serviços de Saneamento Integrado do Norte e Nordeste de Minas Gerais (Copanor), como subsidiária da Copasa. Com foco no saneamento da região semiárida para planejar, projetar, executar, ampliar, remodelar, explorar e prestar serviços de abastecimento de agua e de esgotamento sanitário nas regiões Norte do estado e das bacias hidrográficas dos rios Jequitinhonha, Mucuri, São Mateus e Buranhém.

Com 9630 empregados qualificados, premiados e com carreira sólida, a Copasa teve, nos últimos 21 anos, grande atratividade internacional por suas ações, sendo um investimento seguro e com risco baixo. Em sua configuração acionária, 338 acionistas estrangeiros (minoritários), detêm 114.904.278 de ações, representando 30,22% - aqui destaque para a BlackRock, gestora de fundos americana que detêm 5% deste total de ações. Outros 129.001 acionistas são nacionais (minoritários) com 74.027.540, o equivalente a 19,47% das ações. Já o Estado de Minas Gerais detém 190.249.612, representando 50,03%. Residualmente, as ações em tesouraria são 1.071.639, 0,28% do total.         

Novo Marco do Saneamento

O Novo Marco do Saneamento foi instituído em julho de 2020 e trouxe profundas mudanças no setor, sobretudo fixação de metas para a universalização até 31 de dezembro de 2033, sendo 99% de cobertura em água potável. Extremamente criticado em vários pontos – principalmente no que se concerne ao lobby das empresas privadas de saneamento – o Novo Marco do Saneamento impôs uma série de desafios.  

Para alcançar a universalização do saneamento no Brasil o governo lançou o Programa Nacional de Saneamento Básico (Plansab), que prevê investimentos de R$ 500 bilhões até 2033. A Agência Nacional de Água e Saneamento (ANA), em 2022, confirmou a capacidade da Companhia de Saneamento de Minas Gerais (Copasa) para universalizar o saneamento básico no estado até o fim de 2033. A empresa já atingiu a marca de 99,4% dos imóveis em sua área de atuação com acesso à água tratada, índice que supera a média nacional.

Em relação à coleta e tratamento de esgoto, a Copasa também registrou números acima da média nacional. No caso da coleta, a companhia atingiu 90,5% dos imóveis em sua área de atuação. Desses, 79,45% foram tratados, resultando em 71,9% dos imóveis com esgoto tratado e coletado no estado. Ainda faltam 0,6% de cobertura de água tratada e 28,1% de cobertura de esgoto tratado para alcançar a universalização.

Saneamento, saúde pública e desigualdades

A comprovação da possibilidade de cumprimento das metas de universalização do saneamento pela Copasa explicita a contradição de uma modernização brasileira incompleta. A falta de saneamento básico é um fator de risco para a saúde pública, causando doenças como diarreia, cólera, hepatite A e leptospirose.

Além disso, a falta de saneamento básico pode causar problemas ambientais, como a poluição de rios e mares. Um estudo da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), publicado em 2020, mostrou que as mulheres negras e solteiras são as que mais sofrem com a falta de saneamento básico.

Segundo o estudo, 40% das mulheres negras não têm acesso à coleta de esgoto, contra 35% dos homens brancos. Esses dados mostram que a falta de saneamento básico é um problema que atinge de forma desproporcional as populações mais vulneráveis, como negros, mulheres e pobres.

A falta de saneamento básico também afeta desproporcionalmente as populações indígenas e quilombolas. Um estudo da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB), publicado em 2023, mostrou que apenas 20% dos territórios indígenas tinham acesso à água tratada e apenas 10% tinham acesso à coleta de esgoto.

Outro estudo, publicado pelo Ministério Público Federal (MPF) em 2023, mostrou que comunidades quilombolas no estado de Sergipe também sofrem com a falta de saneamento básico. O estudo mostrou que 80% das comunidades quilombolas não tinham acesso à água tratada e 70% não tinham acesso à coleta de esgoto.

A falta de saneamento básico também é um problema grave nas comunidades vulneráveis periféricas. Um estudo da Mares, publicado em 2022, mostrou que apenas 30% das comunidades vulneráveis periféricas tinham acesso à coleta de esgoto e apenas 50% tinham acesso à água tratada.

Esses dados mostram que a falta de saneamento básico é um problema que afeta de forma significativa as populações das favelas, que já enfrentam outros desafios, como a violência e a falta de oportunidades.

Atualmente, pessoas do Cadastro Único para Programas Sociais (CadÚnico) estão inseridas na tarifa social da Copasa, abrangendo 690.315 famílias mineiras, em 2023.

Empresa pública a serviço de todos

A Copasa, enquanto promotora de saneamento é também decisiva para a justiça social, garantia de direitos, saúde pública e inclusão econômica. A manutenção da Copasa pública contribui para a diminuição das desigualdades raciais, sociais, econômicas e étnicas.


Lucas Tonaco é secretário de Comunicação da Federação Nacional dos Urbanitários (FNU) e dirigente do Sindágua-MG

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Este é um artigo de opinião. A visão dos autores não necessariamente expressa a linha editorial do jornal

Edição: Elis Almeida