Minas Gerais

DIREITO

Cidades mineiras convivem com o risco da falta de água

Em Minas Gerais, 18% da população sofrem com a falta de serviços de água e esgoto

Belo Horizonte (MG) | Brasil de Fato MG |
Foto - - Guilherme Dardanhan/ALMG

Poluição de nascentes, privatização do serviço de distribuição e o modelo predatório da mineração são alguns dos fatores que ajudam a explicar o fato de milhares de pessoas conviverem com a falta de água tratada para consumo ou com a ameaça de desabastecimento hídrico em cidades de Minas Gerais. 

Dados do Sistema Nacional de Informações de Saneamento (SNIS), divulgados em setembro do ano passado, indicaram que nos 34 municípios da Região Metropolitana de Belo Horizonte (RMBH), 10 de cada 100 habitantes não recebem fornecimento de água potável. Esse índice equivale a aproximadamente meio milhão de pessoas. Em todo o estado, 18% da população sofre com a falta de serviços de água e esgoto.

Mineração e poluição das águas

O cenário, que já é alarmante, pode se tornar ainda mais preocupante caso os projetos minerários avancem na região. 

“Onde há mineração, nós temos conflitos de água. A RMBH é um dos casos mais alarmantes. O Rio Paraopeba já foi destruído e existem vários projetos de mineração que vão prejudicar a oferta de água e contaminar ainda mais os cursos da água no Rio das Velhas”, explicou Luiz Paulo Siqueira, da direção nacional do Movimento Pela Soberania Popular na Mineração (MAM), em entrevista ao Brasil de Fato MG

Outro empreendimento enfrentado pelos moradores da RMBH é o Rodoanel Rodoviário, projeto do governo de Romeu Zema (Novo), apelidado pelos movimentos sociais de “rodominério da Vale”. A população denuncia que a infraestrutura de mais de 100 quilômetros ameaça a represa de Vargem das Flores, em Contagem, que abastece mais de 500 mil pessoas. 

Dos R$5,09 bilhões necessários para a obra,  R$3 bilhões vêm do acordo entre o governo estadual e a mineradora Vale S/A, como reparação pelo rompimento da barragem em Brumadinho, em 2019. O crime socioambiental contaminou o Rio Paraopeba, que era responsável por 30% do abastecimento hídrico de BH.

Em Pompéu, moradores da comunidade Fazendinhas Baú, uma das áreas atingidas pelo rompimento da barragem, relatam que, passados cinco anos, ainda falta água limpa. 

“Era um paraíso e se transformou em um deserto. A gente não tem mais nada. O que a gente tinha plantado, hoje não pode ser regado. O que a gente rega, não pode ser colhido. Se for colhido, não pode ser consumido. A gente tem medo”, lamentou Cristina Aparecida Moreira Pereira, moradora da comunidade.

Nas demais regiões de MG, outras comunidades também vivenciam o risco de ficar sem acesso à água por conta da atividade de mineradoras. Em Manhumirim e Belisário, por exemplo, a população denuncia o avanço da mineração de bauxita.

“No caso da mineração da bauxita ainda tem uma questão em particular, porque esse mineral cumpre o papel na natureza de absorver a água e ir soltando no lençol freático, durante o período de seca. Ao minerar, a tendência é secar, impactando na nossa sobrevivência”, explicou Marleidiam Portes de Freitas, moradora da região, em reportagem do Brasil de Fato MG

Privatização

Outro fator que ameaça a segurança hídrica de centenas de municípios mineiros é a privatização do serviço de distribuição de água. Em Ouro Preto, por exemplo, moradores lutam pela remunicipalização do tratamento e distribuição de água. Eles relatam que, desde que a empresa privada Saneouro passou a ser responsável pelo serviço no município da região central do estado, a população convive com cortes de abastecimento e cobranças de tarifas abusivas.

Em Governador Valadares, no Vale do Rio Doce, o cenário se repete. Recentemente, a empresa Aegea, ou Águas de Valadares, assumiu o serviço na cidade, substituindo a autarquia municipal que era responsável pela distribuição de água. Desde então, moradores de diferentes bairros do município relatam falta de água. 

Ao mesmo tempo, a gestão de Romeu Zema busca entregar para a iniciativa privada a Companhia de Saneamento de Minas Gerais (Copasa). Atualmente, a estatal realiza a distribuição e o tratamento de água de 75% dos municípios do estado e atua com uma política chamada de “subsídio cruzado”, que consiste em utilizar o recurso dos municípios que geram lucro para investir nas regiões que não geram, frequentemente cidades pequenas e com grandes áreas rurais. Isso, segundo especialistas, pode deixar de existir se a empresa for entregue à iniciativa privada.

“Quando você privatiza e deixa por conta do mercado, os preços começam a ficar muito voláteis. A tarifa pode aumentar consideravelmente e muitas pessoas deixam de ter acesso a esses serviços, o que não pode acontecer. É um direito da população que tem que ser garantido”, comentou a economista e cientista política Maria Rita Pinheiro de Oliveira, em reportagem do Brasil de Fato MG.

 

Edição: Leonardo Fernandes