Minas Gerais

Coluna

Barragens e crise climática: uma combinação de alto risco

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Foto: SEMA / MT - Reprodução / Agência Brasil
O que faremos com as 340 barragens de mineração que temos, 47 delas classificadas em nível de risco?

Minas Gerais pode ter um “cenário Mad Max” com lama de barragens cobrindo diversos municípios, casas e pessoas soterradas, estradas fechadas, mais de 70% da população da capital absolutamente sem água. Na Semana do Meio Ambiente, é urgente que estejamos alertas e atuantes para o risco extra que as barragens oferecem no contexto de eventos climáticos extremos.

Vivemos uma crise climática sem precedentes, com o trágico e recente exemplo do Rio Grande do Sul, que contabiliza mais de 170 mortos, além de 617 mil pessoas que ainda estão fora de suas casas. No território gaúcho, foram cerca de 800 mm de chuva em 15 dias. 

Sabemos que, infelizmente, os eventos climáticos extremos serão cada vez mais comuns e nossas barragens não estão preparadas. A Fundação Estadual do Meio Ambiente (Feam) afirmou em ofício à Assembleia Legislativa que as barragens de rejeitos usam a base para o cálculo de capacidade de volume dois critérios possíveis que abarcam entre 300 a 400 mm de chuva por dia.

O rompimento de barragens que poderia gerar o cenário Mad Max é uma possibilidade real se nada for feito. Além de tudo, ficaríamos sem a captação de água Bela Fama, principal ponto para o abastecimento hídrico da capital mineira. 

Teríamos a ínfima quantidade de dois mil caminhões-pipa para distribuir água para toda a cidade, conforme prevê o plano elaborado a partir da lei municipal 11.288/2021, de minha autoria junto a outros vereadores, que obriga a prefeitura e a Copasa a terem um plano de ações para emergências e contingências relacionado ao abastecimento de água, em caso de rompimento de barragens que comprometam o abastecimento hídrico da capital.

Não dá para ser negacionista e fingir que nada está acontecendo. Como nosso estado vai se preparar para eventos climáticos extremos? O que vamos fazer com as 340 barragens de mineração que temos, sendo 47 classificadas em nível de alerta segundo a Agência Nacional de Mineração (ANM)?

Estamos trazendo esse debate para a Assembleia Legislativa e lutando com a sociedade civil por mudanças profundas nas políticas públicas e parâmetros ambientais do estado que precisam considerar o novo contexto climático. Em outubro do ano passado, fizemos uma audiência pública com o Fórum Permanente São Francisco, representações da Defesa Civil, Secretaria de Meio Ambiente e Agência Nacional de Mineração. Os integrantes do fórum apontaram os riscos de rompimento das barragens e a falta de equipamentos para medições precisas da quantidade de chuvas em suas proximidades.

Em maio, no contexto das chuvas do Rio Grande do Sul, participamos de uma nova audiência pública, que durou mais de sete horas, para debater os riscos para Minas Gerais. Ambientalistas, especialistas e movimentos sociais reforçaram as preocupações com a quantidade de barragens em situação de risco e a frequência cada vez maior de eventos climáticos extremos, somados ao enfraquecimento dos órgãos de fiscalização, como uma combinação de alto risco para nosso estado.

Dois projetos de leis e uma PEC para enfrentar crise climática

Diante desse cenário, é urgente atuar em diversas frentes. Além de fiscalizar com frequência as mineradoras, também fizemos dois projetos de leis e uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC), apresentadas na Semana do Meio Ambiente, para tratar de eventos de emergência climática. Nossas propostas legislativas são para que o Estado possa prevenir tragédias e agir de forma rápida e eficaz, minimizando danos para a população e para o meio ambiente.

A PEC propõe adicionar à Constituição de Minas Gerais políticas e planos estaduais de ação climática. O plano e a política de enfrentamento a eventos climáticos extremos devem ser atualizados, no mínimo, a cada quatro anos, e precisam considerar medidas de diagnóstico, planejamento, monitoramento, prevenção, resposta e recuperação, além de metas que considerem as particularidades regionais e metropolitanas.

Já o Projeto de Lei Clima e Territórios Minerados (PL 2.457/2024) institui a política de prevenção e combate aos desastres decorrentes de chuvas intensas em territórios com mineração. Propomos que o Estado crie programas, planos e procedimentos para prevenir desastres decorrentes de chuvas extremas. O projeto também inclui sistemas de monitoramento e acompanhamento de dados de fenômenos hidrológicos, fluviológicos e meteorológicos específicos aos municípios com mineração.

O segundo projeto que apresentamos nesta semana, inspirado na proposta da deputada federal Erika Hilton (PSOL), é o Projeto de Lei de Refugiados Climáticos (PL 2.456/2024). O PL altera a Lei nº 15.660, de 2005, que instituiu a política estadual de prevenção e combate a desastres decorrentes de chuvas intensas, substituindo-a pela política estadual de prevenção e enfrentamento às vulnerabilidades decorrentes de eventos climáticos extremos. 

O texto estabelece que o Estado tenha programas, estudos e procedimentos para prestar socorro, assistência médico-social, abrigo e manutenção de serviços essenciais para as populações atingidas por eventos climáticos extremos.

Agora, vamos seguir na luta para que os dois projetos de leis sejam aprovados e que a PEC tenha a assinatura de 26 deputados para seguir tramitando na Assembleia Legislativa.

O poder público precisa adotar com rapidez e eficiência políticas e parâmetros a partir de dados, de análises técnicas e de projeções reais dos riscos que Minas Gerais corre. Não podemos cruzar os braços, esperar o pior acontecer e depois colocar a culpa nas chuvas. É responsabilidade de todos nós, especialmente de quem foi eleito pela sociedade civil, agir agora!

 

Bella Gonçalves é uma mulher, lésbica, lutadora pelo direito à cidade e deputada estadual de Minas Gerais (PSOL).

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Leia outros artigos de Bella Gonçalves em sua coluna no jornal Brasil de Fato MG.

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Este é um artigo de opinião. A visão da autora não necessariamente expressa a linha editorial do jornal.

Edição: Leonardo Fernandes